Ano de 2024
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Dezembro
10 de dezembro – Dia Internacional dos Direitos Humanos
O Dia Internacional dos Direitos Humanos foi escolhido, por decisão da Assembleia Geral da ONU na sua reunião plenária de 4 de dezembro de 1950, para comemorar a Declaração Universal dos Direitos do Homem, proclamada no dia 10 de dezembro de 1948.
Da Declaração Universal dos Direitos constam as liberdades fundamentais e os direitos humanos para uma existência digna. Contribuíram para a sua elaboração países de todos os continentes, exceto o africano. Portugal também não participou nesta iniciativa, só em 1978 foi ratificada a Convenção Europeia dos Direitos do Homem pelo Governo Português e publicada, em Diário da República, a Declaração Universal dos Direitos do Homem.
A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, também conhecida como Carta de Banjul, foi aprovada em 1981 pela Organização de Unidade Africana, após as independências dos territórios africanos. Depois da entrada em vigor desta Carta, em 1986, foi criado o Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos, que complementa e reforça as funções da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, ainda que somente 8, dos 34 estados africanos, tenham reconhecido a competência do Tribunal nos casos e litígios relacionados com a interpretação e aplicação do previsto na Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.
Na Europa, o Conselho da Europa[1] (1949) é a principal organização de defesa dos direitos humanos e adotou em 1950 a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que entrou em vigor em 1953, e foi elaborada com base na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Para efetuar o controlo do cumprimento da Convenção, o Conselho da Europa criou dois órgãos, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e o Comité de Ministros do Conselho da Europa.
Esta Convenção é um tratado internacional que protege os direitos humanos e as liberdades fundamentais na Europa. Os 46 países que formam o Conselho da Europa são parte nesta Convenção e, destes, 27 países são os membros da União Europeia. Atualmente, além desta, estão em vigor mais de 200 convenções e acordos internacionais, formalizados no Conselho da Europa, que abrangem diferentes áreas da vida em sociedade, desde a cooperação internacional até ao desenvolvimento científico e tecnológico.
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem por missão proteger os cidadãos contra violações dos direitos humanos e, por isso, qualquer pessoa cujos direitos tenham sido violados por um Estado, nos termos da Convenção, pode levar o caso ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem para uma reparação adequada.
O Comité dos Ministros do Conselho da Europa é constituído pelos ministros dos Negócios Estrangeiros de cada estado-membro, define a política do Conselho da Europa e aprova o seu orçamento e plano de atividades.
Estas são cartas dos direitos e liberdades do indivíduo independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, religião ou qualquer outra condição, do século XX. Mas, controvérsias à parte, desde a Antiguidade que situações de extrema indignação levaram à criação de cartas em defesa de direitos, sobretudo os de propriedade. Alguns exemplos que podem ser considerados como tal são o Cilindro de Ciro, 539 A.C. na Babilónia; as Leis Gerais, de 1211, em Portugal; a Magna Carta, de 1215, e a Petição de Direitos, de 1628, em Inglaterra.
Mais abrangentes em direitos foram posteriormente, a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, de 1776, e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, ainda que nestas cartas os princípios de igualdade e fraternidade tenham contemplado apenas os indivíduos do sexo masculino, proprietários, e ignorado os que eram vítimas de escravatura e segregação, tanto nos Estados Unidos da América como em França, países que mantiveram políticas de dominação para muitos dos seus cidadãos.
De facto, o maior impacte da Declaração de 1789 foi no desenvolvimento das ideias de democracia e liberdade individual na Europa, ao combinar direitos civis, relativos à liberdade individual, e direitos políticos, relativos à participação política. Ao considerar os direitos de liberdade, propriedade, segurança e resistência à prepotência, reconheceu a igualdade entre iguais, sobretudo perante a lei e a justiça. Também reforçou o princípio da soberania popular, da separação de poderes e dos direitos básicos do ser humano, mas ignorou os direitos sociais relativos a educação, saúde, trabalho, e outros, porque para os políticos e pensadores do séc. XVIII a Declaração destinava-se aos cidadãos livres, proprietários e do sexo masculino, não incluía as mulheres, nem os que não possuíam bens.
Por isso, a escritora francesa Marie Gouze escreveu, em 1791, a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã que reivindicava para as mulheres a inclusão de direitos e deveres iguais aos dos homens, na Declaração de 1789, o que significava que homens e mulheres passariam a ter os mesmos direitos e deveres na vida pública e na privada. O significado histórico da Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã reside no facto de ser a primeira declaração universal de direitos humanos a propor um critério igualmente válido para homens e mulheres.
Apesar de tudo, os direitos humanos continuam a ser violados diariamente, de forma atroz, em muitos países. As vítimas continuam a ser os economicamente mais desfavorecidos, na forma de discriminação social ou atentado à integridade física ou mesmo à vida, sobretudo as crianças, as mulheres, as pessoas com deficiência ou outras doenças, a comunidade LGBT, os povos indígenas e as minorias étnicas.
Em 1998, ano em que foram comemorados os 50 anos da Declaração Universal dos Direitos do Homem, algumas iniciativas nacionais beneficiaram do apoio do FACC – Fundo de Apoio à Comunidade Científica, aqui encontra os processos disponíveis para consulta no Arquivo de Ciência e Tecnologia.
[1] O Conselho da Europa é uma organização internacional que atua na defesa dos Direitos Humanos, da Democracia e do Estado de Direito. Foi fundado em 1949 e atualmente conta com 46 estados-membros, 27 dos quais são os que constituem a União Europeia. Não é um órgão legislativo, mas tem a responsabilidade de zelar pelo cumprimento dos acordos internacionais dos seus membros.
WEBGRAFIA
African Union (2024). Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. ACHPR.
Conselho da Europa (2024). Impactos da Convenção Europeia dos Direitos Humanos
Domingues, Joelza Ester (2020, 25 de agosto). As Declarações dos Direitos do século XVIII: avanços e limites. Blog Ensinar História.
Gouges, Olympe de. Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã. Instituto +Liberdade (2021). Tradução de Ana Maria Coutinho.
Nações Unidas, Centro Regional de Informação para a Europa Ocidental (2024). Declaração Universal dos Direitos Humanos. UNRIC.
Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos (2024). AFCHPR.
Tribunal Europeu (2024). Convenção Europeia dos Direitos do Homem | TEDH | CDH-ONU | Interpol-CCF.
United Nations (2024). Dia dos Direitos Humanos 10 de dezembro. UN.
Rosália Dias Lourenço
Novembro
1755 – O ano que mudou Lisboa
A 1 de novembro de 1755, dia de todos os santos, pelas 9h40m da manhã, a terra tremeu e com tal violência, várias vezes, num total de cerca de 17 minutos.
No ano em que se assinalam os 269 anos do Grande Terramoto de Lisboa (GTL) (Ferreira, 2013), relembramos o fenómeno que no século XVIII mudou a vida social, política e económica de uma cidade que era também capital de um Império, Lisboa, e cujo fenómeno foi falado e documentado no mundo de então, trazendo racionalidade às causas de tal fenómeno, incluindo os primeiros passos para o que viria a ser o estudo, cientificamente orientado, da sismologia.
O sismo teve o epicentro a sudoeste do cabo de S. Vicente e terá atingido cerca 8,6 na escala de Richter e cujo abalo mais forte terá durado cerca de 9 minutos. Depois dos abalos seguiram-se as derrocadas e os incêndios, o Tejo recuou para de seguida trazer uma onda gigantesca que assolou toda a zona ribeirinha. Uma tragédia que tirou a vida a cerca de 15 mil pessoas numa população que se estimava de cerca de 260 mil. Os incêndios e as réplicas mantiveram-se nos dias seguintes. Lisboa ficou praticamente destruída.
Todo o país foi atingido pela catástrofe, destacando-se sobretudo o Algarve e a costa marítima a sul, em particular a cidade de Lagos, assolados também pelo tsunami que se lhe seguiu, cerca de 20 a 30 minutos após os abalos.
Depois da tragédia havia que reconstruir e Sebastião José de Carvalho e Melo, com experiência na diplomacia europeia e conhecedor das novas ideias Iluministas da época, empreende a difícil tarefa de reconstrução da cidade de Lisboa. Um dos obreiros foi o Engenheiro-mor Manuel da Maia, que já se havia notabilizado em projetos como o Aqueduto das Águas Livres. Curiosamente, Manuel da Maia era também Guarda-mor do Real Arquivo da Torre do Tombo desde 1745.
À época, a Torre do Tombo estava sediada no Castelo de São Jorge, que apesar de ter ruído parcialmente, não foi afetado pelos incêndios, tendo sido possível recuperar a documentação. Para o efeito, foi construída uma barraca na Praça de Armas do castelo, destinada a guardar a documentação enquanto se definia uma localização definitiva. Esta viria a ser decidida em 1757, para o então Mosteiro de S. Bento da Saúde, atual Palácio de S. Bento. É nesta sequência que Manuel da Maia dirige a ordenação da documentação tendo-se constituído a coleção denominada por ‘Corpo Cronológico’, hoje inscrita na UNESCO (ANTT, 2017).
Seguindo as ideias Iluministas a reconstrução de Lisboa foi previamente pensada, racionalizada, para que se pudesse evitar num futuro, um grau de destruição tão devastador como o que sucedera. Foram projetados edifícios que pudessem ter cerca de três a quatro andares, mas que tivessem elasticidade suficiente para puderem resistir a abalos sísmicos semelhantes, tendo sido criada a estrutura designada de “gaiola”, característica dos edifícios pombalinos, assim como a base destes edifícios, assente em estacas de pinho verde.
Para se perceber o grau de destruição do terramoto, foi elaborado um inquérito e enviado às paróquias da época com algumas questões de interesse que viriam a revelar-se importantes para o futuro estudo do GTL. Seria um pequeno embrião para o estudo da sismologia em Portugal que, curiosamente, e apesar de termos vivido o fenómeno, não fomos pioneiros no seu estudo científico muito embora tenhamos deixado alguns contributos.
O Grande Terramoto de Lisboa desencadeou também um terramoto intelectual na época. As notícias do desastre chegaram aos centros da Europa por volta do fim do mês de novembro e muitos intelectuais escreveram sobre o sucedido, nomeadamente Voltaire, Kant e John Mitchel (1724-1793). Este último, membro da Royal Society, escreveria que os terramotos sentidos em várias localidades deveriam ter origem no movimento interior da terra, provocando uma propagação ondulatória (Ferreira, 2013). Este acontecimento marca o início do interesse pelo fenómeno sismológico em Portugal e na Europa, porém, não terá sido em Portugal que a sismologia se desenvolveu. Ainda assim, destaca-se o trabalho de 1758 de Moreira de Mendonça, A História Universal do Terramoto, considerada uma obra moderna pelo facto de apresentar evidências que suportam a tese de que o terramoto é um fenómeno natural, mostrando que ultrapassa os limites da capital do Reino, tratando-se de um fenómeno mais frequente e global para ser considerado um castigo divino. Moreira de Mendonça efetuou um registo das ocorrências sísmicas, sobretudo das réplicas que se seguiram, para suportar as suas ideias. Estavam lançadas as bases para uma contribuição para a sismologia moderna.
O que sabemos hoje sobre o epicentro do GTL?
Segundo um artigo de vários autores (Terrinha et alli, 2003), na zona do hipotético epicentro do sismo de Lisboa, foi identificada na área submersa do sudoeste português, entre o Cabo de S. Vicente e o Banco de Gorringe uma estrutura tectónica com todas as características sismo-estratigráficas e geomorfológicas de uma falha ativa designada por ‘Falha de Marquês de Pombal’ (FMP), dando origem a um conjunto de estudos e projetos para a compreensão da atividade tectónica naquele local. Em 2003, colocava-se então a hipótese de a FMP terminar subitamente no encontro com outras duas falhas de transferência, quer a norte quer a sul, pelo que se pensa apresentar um comprimento superficial não superior a 60Kms. Por sua vez, em 2005, Luís Mendes Victor, em entrevista ao Expresso referia o seguinte: “Esta tem entre 50km a 100km, o que significa que é necessário adicionar-lhe outras falhas para chegarmos aos 200km, a extensão que faz sentido para um sismo com aquelas características.” (Azevedo, 2009).
Estaremos, hoje, preparados para um fenómeno semelhante?
Sentimos em agosto passado um abalo sísmico de 5,1 na escala de Richter, que veio relançar a questão sobre o tema. Segundo os investigadores do tema terá de haver reflexão ao nível da monitorização de zonas sensíveis, definição e cumprimento de regras no que diz respeito à construção civil, assim como planeamento e reordenamento do território, sobretudo nas zonas costeiras.
Em 2005, por ocasião do 250º aniversário do GTL, foram organizados vários eventos para assinalar a data, nomeadamente dois colóquios que contaram com o apoio da FCT, através do Fundo de Apoio à Comunidade Científica (FACC). Falamos do Colóquio Internacional “O Terramoto de 1755: Impactos Históricos” promovido pelo ISCTE e pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que decorreu entre os dias 3 a 5 de novembro, nas instalações destas duas entidades; e, a Conferência Internacional “250th Anniversary of the 1755 Lisbon Earthquake” organizado pela Sociedade Portuguesa de Engenharia Sísmica e que decorreu na Universidade Nova de Lisboa entre os dias 1 e 4 de novembro.
Estes processos de financiamento podem ser consultados no Arquivo de Ciência e Tecnologia acedendo à série Iniciativas científicas financiadas.
FONTES
Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (2005). Colóquio Internacional “O Terramoto de 1755: Impactos Históricos”. PT/FCT/FCT/DAI-EPPFACC/001/1018. Arquivo de Ciência e Tecnologia. Fundação para a Ciência e Tecnologia. Lisboa, Portugal.
Sociedade Portuguesa de Engenharia Sísmica (2005). “International Conference 250th Anniversary of the 1755 Lisbon Earthquake”. PT/FCT/FCT/DAI-EPPFACC/001/1021. Arquivo de Ciência e Tecnologia. Fundação para Ciência e Tecnologia. Lisboa, Portugal.
WEBGRAFIA
Arquivo Nacional Torre do Tombo (2017, 15 de dezembro). O Terramoto de 1755, a Torre do Tombo e Manuel da Maia. DGLAB.
Azevedo, V. (2009, 12 de dezembro). “Não estamos preparados para um terramoto semelhante ao de 1755”. Expresso.
Boléo, M. L. P. (2006, 10 de agosto). Recordar o Terramoto de 1755. Blog O Leme. Arquivo.pt
Ferreira, J. M. Q. G. (2013). Da sismicidade à ciência dos sismos: para a história da sismologia em Portugal [Tese de doutoramento, Universidade de Évora]. Repositório Científico da Universidade de Évora.
Terrinha, P., Zitellini, N., Matias, L., Gràcia, E., Ribeiro, A., Mendes Víctor, L., Dañobeitia, J., Pinheiro, L. M., Gafeira, J., Matias, H., & Roque, C. (2003). Falha de Marquês de Pombal: estrutura sismo-tsunamigénica do sismo de Lisboa de 1 de Novembro de 1755? Estrutura, morfologia e sedimentação associadas. In VI Congresso Nacional de Geologia (pp. 65–68). Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Ciências e Tecnologia.
Suzana Oliveira
Outubro
Sabia que Portugal acolheu, há 90 anos, o III Congresso da Academia Internacional de História da Ciência?
Na sequência dos primeiros congressos da Academia Internacional de História da Ciência – em Paris, em 1929, e em Londres, em 1931 – realizou-se em Portugal o III Congresso da Academia Internacional de História da Ciência, no ano de1934, nas universidades de Lisboa, Coimbra e Porto, entre 30 de setembro e 6 de outubro. Teve a participação de personalidades que procuravam integrar a História da Ciência no âmbito dos congressos científicos especializados, que apresentaram reflexões sobre tudo o que constituía o trabalho científico, nos contextos sociais e políticos em que se desenvolvia.
Promovido pela Academia Internacional de História da Ciência, que organizava de três em três anos um congresso internacional, com a finalidade de reunir cientistas para troca de ideias e partilha de novos estudos e trabalhos, coube a Aldo Mieli, Secretário Permanente da Academia, a responsabilidade de coordenar o evento. Este III congresso da Academia esteve inicialmente marcado para Berlim, mas com a ascensão de Hitler ao poder em 1933, Aldo Mieli decidiu que deveria ser feito noutro país.
Aldo Mieli (1879-1950), foi Secretário da Academia Internacional de História da Ciência entre 1928 e 1939, considerado um dos fundadores da História da Ciência, escreveu livros e artigos sobre esta disciplina. Foi professor na Universidade de Roma e na Universidade de Santa Fé, Argentina. Fundou, em 1919, o Archeion, jornal fundamental na divulgação do estudo da História das Ciências. No volume 16 da Revista Archeion (1934) é possível conhecer a cobertura feita ao III Congresso da Academia Internacional de História da Ciência.
A Academia Internacional de História da Ciência, desde a sua criação que tinha grupos de trabalho nos seus países membros, cientistas e investigadores de mérito reconhecido, por isso Mieli contactou os colegas do grupo espanhol para que o III Congresso se realizasse em Portugal e Espanha. No entanto, após algumas conversações, as divergências entre o grupo espanhol e a Academia fizeram com que Portugal fosse o país escolhido para acolher o III Congresso.
Depois de decidido que o congresso se realizaria em Portugal, coube a Arlindo Camilo Monteiro, que pertencia ao Grupo Português de História da Ciência, organizar o congresso. Arlindo Camilo Monteiro era Secretário da Secção de Lisboa do Grupo Português de História da Ciência e médico com vários trabalhos publicados na área de História da Medicina em Portugal. Foi membro correspondente da Académie Internationale d’Histoire des Sciences, da Société Internationale d’Histoire de la Médicine e da Academia Hispano Americana de Ciencias y Artes.
Conseguiu os apoios do governo e das três universidades portuguesas que acolheram o congresso, no qual participaram representantes da Alemanha, Argentina, Bélgica, Brasil, Checoslováquia, Egipto, Espanha, França, Itália, Marrocos, Roménia, Suíça e Portugal. As comunicações portuguesas foram sobre História da Ciência, História da Medicina e História da Cartografia e das Descobertas.
Desde meados do século XIX que alguns cientistas tinham tido a necessidade de ser também historiadores da Ciência. Movimento liderado pela Alemanha, rapidamente se estendeu a outros países da Europa – Rússia, Inglaterra e França – e também aos Estados Unidos da América. Começaram por publicar reimpressões de textos antigos, para facilitar o acesso e o conhecimento dos trabalhos anteriormente feitos, mas é também desta data o aparecimento dos primeiros periódicos dedicados à História da Ciência com a criação de publicações para o registo de atividades científicas específicas, geralmente associadas às academias nacionais de Ciência. É o caso da revista Isis, que começou por ser publicada na Europa, pouco antes da I Guerra Mundial, por George Sarton, que mais tarde a levou para os Estados Unidos da América, onde rapidamente se tornou órgão da Sociedade Norte-Americana de História da Ciência e que é, até hoje, a mais antiga revista da especialidade.
Os congressos, mais ou menos especializados, aumentaram a divulgação científica, assegurada pelas academias de Ciência, que sempre funcionaram em rede. Cientistas que discutiam ideias e partilhavam conhecimento, com a sustentação do grupo a que pertenciam tinham a garantia de acesso a congéneres intelectuais. Do individual para o social, numa partilha de conhecimentos e de relacionamentos entre academias e outras sociedades científicas, numa riqueza de experiências partilhadas pelo alcance possibilitado pelas instituições, a relação entre a investigação científica e os contextos em que é produzida tem uma abrangência multidisciplinar que vai desde a realidade histórico-cultural até ao processo de divulgação dos resultados.
No ACT, nos fundos Augusto Pires Celestino da Costa (1884 – 1956) e Luís Ernâni Dias Amado (1901 – 1981) pode ser conhecido o trabalho destes cientistas portugueses que também foram importantes para a História da Ciência.
WEBGRAFIA
Bispo, A.A.(2011). Da história das ciências como objeto de estudos culturais e dos science studies: Revendo o III Congresso da Academia Internacional de História das Ciências em Portugal (1934) e a participação do Brasil: Francisco Jaguaribe Gomes de Mattos. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 130/10, 2.
Nunes, M.F. (2010). O III Congresso Internacional de História da Ciência: Portugal, 1934: contextos científicos, contextos culturais e políticos. In: Machado, F.A., Gama, M.R. & Fernandes, J.M. (Eds.), Caminhos de cultura em Portugal (pp. 321-336). Universidade de Évora.
Roca-Rosell, A. (2022). Aldo Mieli (1879–1950) and the origin of the History of Science in Spain: From the creation to the dissolution of the spanish group. In: Borgato, M.T., Phili, C. (Eds) In Foreign lands: The migration of scientists for political or economic reasons: Trends in the History of Science. Birkhäuser, Cham.
Rosalia Dias Lourenço
Setembro
Sabia que existiu uma Associação dedicada à informação científica e técnica designada INCITE?
A INCITE era a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento da Informação Científica e Técnica, constituída a 21 de novembro de 1984 e reconhecida como pessoa coletiva de utilidade pública em 1998 (Declaração, 1998). No ano de 2000 a INCITE procedeu à alteração dos seus estatutos tendo alterado o nome para Associação Portuguesa para a Gestão da Informação. Trabalhou ativamente até 2014, ano em que foi dissolvida em Assembleia Geral.
Esta Associação tinha como objetivo a promoção da informação científica e técnica, fomentando os princípios, as metodologias e as ferramentas da gestão da informação. Desta forma a INCITE procurava contribuir para o desenvolvimento e valorização dos profissionais ligados à área da gestão da informação, assim como para a igualdade de acesso à informação e ao conhecimento indispensável ao exercício da cidadania numa sociedade democrática. O cumprimento deste objetivo materializou-se num vasto conjunto de ações que se foram desenvolvendo ao longo dos 30 anos de existência da Associação (INCITE, 1985).
Procuraram estabelecer e apoiar o desenvolvimento de padrões de excelência na criação, gestão e partilha de recursos de informação e do conhecimento, muitas vezes através da organização de debates, seminários, e outros eventos.
Também tinha como objetivo contribuir para a criação e desenvolvimento de um sistema de certificação profissional, pretendia que o uso das tecnologias de informação e comunicação fosse generalizado, procurando ser parceira de entidades públicas ou privadas, nacionais, comunitárias e internacionais colaborando na definição e estabelecimento de políticas de informação com foco no estabelecimento de medidas destinadas a desenvolver a Sociedade da Informação. Nesse sentido, desde o início da sua atividade, a INCITE estabeleceu parcerias com instituições do ensino superior, nomeadamente as universidades de Aveiro, do Porto, do Minho e Lusófona.
A INCITE trabalhou na promoção dos serviços de informação e no desenvolvimento profissional, participando no projeto europeu DECIDoc-Developing Euro Competencies Information and Documentation, que tinha como objetivo a elaboração e validação do Referencial Europeu de Competências em Documentação e Informação e a sua tradução e posterior edição. O projeto foi submetido à Comissão Europeia, no âmbito do programa Leonardo da Vinci, pelo ECIA, Conselho Europeu das Associações de Informação e Documentação. A INCITE foi um dos seis membros do ECIA parceiro na execução do projeto liderado pela ADBS de França (Correia, 2003).
Na fase final de elaboração do referencial houve um processo de validação por parte de cada um dos países que faziam parte do consórcio. Em Portugal foram consultadas as entidades que representavam os profissionais de informação, os empregadores e os professores/formadores. Assim, foram consultadas as associações APDIS, BAD e Liberpolis, cursos de pós-graduação, escolas profissionais, organizações profissionais e empresariais, entre outros (Correia, 2003).
Outra preocupação da INCITE prendia-se com a normalização terminológica que se materializou na elaboração de alguns glossários e tesauros, nomeadamente, Glossário de terminologia das novas tecnologias aplicadas à informação especializada o Repertório das linguagens documentais utilizadas em bibliotecas e serviços de documentação nacionais e o Glossário e tesauro de informática.
No decurso da sua existência a INCITE foi financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) através do Programa de financiamento Fundo de Apoio à Comunidade Científica (FACC), constituído na Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), a antecessora da FCT. Este financiamento foi atribuído nos anos de 1988 a 2005 para o desenvolvimento das suas atividades enquadrando-se na tipologia financiamento de sociedades científicas ou outras instituições científicas da mesma natureza (JNICT, 1978-1998; FCT, 1996-2010).
A INCITE, enquanto associação portuguesa no domínio da Ciência e da Sociedade da Informação em Portugal, desenvolveu vários estudos e investigação no caminho da Gestão de Competências e Certificação para uma sociedade do conhecimento. Alguns destes estudos estão disponíveis na Biblioteca da FCT e podem ser consultos através da lista disponibilizada no site.
A INCITE editou uma revista designada Incite Informa que também foi alvo de financiamento da FCT através do FACC, nos anos de 1986 a 1998, na tipologia de apoio à edição de publicações científicas (JNICT, 1978-1998; FCT, 1996-2010).
A Associação desenvolveu algumas iniciativas pioneiras das quais se destaca ter estabelecido um protocolo de cooperação que envolvia as quatro associações profissionais portuguesas ligadas à área da documentação e da informação: a INCITE, a BAD, a APDIS e a LIBERPOLIS. O propósito deste protocolo era criar e dinamizar um Observatório da Profissão Informação-Documentação. O objetivo deste observatório era analisar o desempenho e a evolução destas profissões em Portugal de forma a ser possível estabelecer estratégias que permitissem o seu desenvolvimento (OP-ID, 2014).
Através desta parceria realizaram-se dois inquéritos aos profissionais de informação e documentação: Inquérito para identificação da Auto-Imagem das Competências dos Profissionais I-D e Inquérito para identificação da Imagem Externa das Competências dos Profissionais I-D. Deste trabalho resultou o relatório A imagem das competências dos profissionais de informação e documentação, em 2006.
Na reunião de Assembleia Geral, realizada a 9 julho de 2014, foi deliberada a dissolução das atividades da Associação e foi nomeada uma comissão liquidatária que tinha a incumbência de dar destino aos bens da INCITE, até ao dia 31 de dezembro desse ano. A comissão liquidatária consciente que este património arquivístico era muito importante e deveria ser valorizado, doou-o ao Arquivo Nacional Torre do Tombo no dia 9 de junho de 2015.
FONTES
FCT (1996 a 2010). Iniciativas científicas financiadas. PT/FCT/FCT/DAI-EPPFACC/001. Arquivo de Ciência e Tecnologia. Lisboa, Portugal.
INCITE – Associação Portuguesa para o Desenvolvimento da Informação Científica e Técnica (1985). Estatutos. PT/FCT/JNICT/CFDCT/002/0023. Arquivo de Ciência e Tecnologia. Lisboa, Portugal.
JNICT (1978 a 1998). Iniciativas científicas financiadas. PT/FCT/JNICT/DSPP-DFACC/001. Arquivo de Ciência e Tecnologia. Lisboa, Portugal.
WEBGRAFIA
Correia, Zita P. (2003). Referencial das competências dos profissionais europeus de informação e documentação: da génese às perspectivas de futuro. Cadernos BAD, (1).
Declaração n.º 144/98, de 29 de abril. Diário da República, série II(99).
INCITE – Associação Portuguesa para o Desenvolvimento da Informação Científica e Técnica, Diário da República n.º 80/2000, Série III de 2000-04-04.
Observatório da Profissão de Informação – Documentação (2006). A imagem das competências dos profissionais de informação e documentação. INCITE.
Observatório das Profissões de Informação-Documentação (2014). eOP-ID.
Paula Seguro de Carvalho
Agosto
Visita do Ministro da Educação Nacional, Veiga Simão, às instalações do MNCT.
Fonte: Imagens retiradas de Duarte (2007, p. 199).
Museu Nacional de Ciência e da Técnica de Mário Silva, em Coimbra
Para este mês de agosto, mês de férias e de lazer por excelência, optámos por lembrar a história de um museu, inovador para a época em que foi criado e cujo espólio se encontra hoje no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra. Falamos do Museu Nacional da Ciência e da Técnica (MNCT).
Estávamos em 1971 e por iniciativa do então ministro da Educação Nacional, José Veiga Simão (1929-2014), tomava forma e delineava-se em Portugal a criação de um museu, no âmbito de uma reforma das políticas do governo de então e que ficaria conhecida como “Primavera Marcelista”. Surge a oportunidade de se delinear, dentro de um novo conceito e inspirado em outras instituições congéneres na Europa, e que serviriam de arranque ao projeto que se viria a materializar ainda durante a década de 1970, de um museu das ciências.
Foi escolhido o Professor Doutor Mário Augusto da Silva (1901-1977), aluno de doutoramento de Marie Curie, para encetar o projeto. A escolha terá estado relacionada com uma possível reparação de injustiça feita a Mário Silva, que havia sido afastado compulsivamente em 1947, por decreto, a par de outras individualidades acusadas de defenderem ideias contrárias aos ideais do Estado Novo. Uma vez impossibilitado de regressar à docência universitária por limite de idade, teria a oportunidade de pensar e estruturar um museu com base nas ideias reformadoras da museologia europeia.
Desde cedo, por volta de 1925, que Mário Silva tinha em perspetiva a criação de um museu, inspirado no Conservatoire des Arts e Matieres de Paris, ideia que se viria a materializar a partir de 1971. Neste percurso, o que viria a ser então o Museu Nacional da Ciência e da Técnica, recebia influencias também do Science Museum de Londres, do Deutsches Museum de Munique, do Museum of Science and Industry de Chicago e do Muzeo Nazionale della Scienza e della Técnica de Milão, de onde viria a receber a referência na sua designação de Museu da Ciência e da Técnica e não Tecnologia, conforme Mário Silva viria a explicar a opção numa entrevista que concedeu à RTP em 1976.
Também a ideia, amplamente defendida por Mário Silva, de se tratar de um Museu Nacional, que representasse a diversidade do país e diminuísse as dificuldades financeiras, que promovesse a descentralização e a ideia de um organismo dinâmico em colaboração com escolas e universidades, e finalmente, que participasse da vida intelectual, voltado para o futuro com os instrumentos do passado. Procurar a criação de um centro ativo de ensino e divulgação das ciências, em todos os seus domínios e que pudesse estar na base do desenvolvimento cultural e socioeconómico do país.
Considerava também que o museu deveria ser um meio de divulgação científica, fomentando a investigação, criando para o efeito o boletim Publicações do Museu Nacional da Ciência e da Técnica. Esta edição visava também ser um registo da atividade museológica e arquivística do museu, num diálogo com as aquisições que o museu viesse a adquirir, fazendo um registo sistemático através de um inventário onde constassem documentos gráficos, fotografias ou até mesmo registos cinematográficos que deveriam ser disponibilizados num Centro de Documentação associado à sua atividade.
A ideia de descentralização foi sempre uma característica da sua conceção de museu, pois defendia a criação de uma rede regional chegando mesmo a haver, por exemplo, a integração da casa museu Egas Moniz, em Avanca, na administração direta do MNCT. Houve também a tentativa de integrar outras instituições, nomeadamente o Museu Alberto Mac Bride (que funcionava no Hospital de Santa Marta) em Lisboa, o Museu de Instrumentos e Utensílios de Medição e Cálculo, do Porto, a criação do projeto do Museu do Tramagal, em Abrantes e ainda o projeto do Museu dos Transportes Terrestres na Malaposta, em Carqueijo.
A instalação do museu, foi também uma preocupação, tendo sido identificadas várias soluções, na sua maioria com espaços exíguos para exposição. Foi então decidida a instalação no Palacete de Sacadura Botte, em Coimbra, que numa fase inicial seria apenas a sede administrativa, vindo pouco depois a integrar o espólio e a ter também a vertente expositiva de museu.
Foi elaborado um inventário das peças que o museu foi adquirindo, com a pretensão de ser criado um arquivo geral com a informação acessível ao público. Este inventário deu origem a uma coleção em Ciência e Tecnologia correspondente ao que viria a ser o espólio do museu.
Em janeiro de 1973, aquando da visita de Veiga Simão ao espaço do museu, foram exibidas as maquetas de invenções de Leonardo Da Vinci, uma coleção de onze modelos que havia sido oferecida, em 1971, pela então Companhia IBM Portuguesa ao Ministério da Educação Nacional e que o ministro colocou à guarda do MNCT. Estavam também em exposição teares de Almalaguês, enquanto testemunhos das técnicas artesanais de tecelagem, uma campanha dedicada à conservação da natureza e meio ambiente, uma exposição dedicada a Egas Moniz e outra ao casal Curie. Esta exposição, de carácter permanente, teve o apoio da Philips Portuguesa, que tratou da iluminação do museu.
Outra preocupação de Mário Silva foi a importância da dinamização da atividade do museu que, aliada à ideia de descentralização, promoveu atividades e exibições fora de portas. Foi o caso da comemoração dos 200 anos da reforma pombalina da universidade e a homenagem a Bento de Moura (1702-1766), investigador e professor da Universidade de Coimbra, em Moimenta da Serra, sua terra natal.
Apesar de toda a atividade desenvolvida pelo MNCT, desde 1971, este só seria formalizado em 1976 e em 1979 passaria a ser integrado na dependência do Instituto Português do Património Cultural (IPPC). Só em 1984 é formalmente constituído o quadro de pessoal afeto ao MNCT.
Em 1999, e por se tratar de um museu com preocupações também na área da investigação científica e técnica, transita da dependência do IPPC para o Ministério da Ciência e Tecnologia e passa a designar-se Instituto de História da Ciência e da Técnica (IHCT). Já em 2002, com a designação de Museu Nacional da Ciência e da Técnica Doutor Mário Silva, passa a ser dotado de autonomia administrativa integrando a orgânica do Ministério da Ciência e do Ensino Superior.
Em 2012, por decreto-lei n.º 28/2012 de 8 de fevereiro, o Museu cessa as suas funções enquanto serviço dotado de autonomia administrativa e com atribuições próprias, passando a integrar a orgânica da Universidade de Coimbra, da qual ainda hoje faz parte com a designação de Museu da Ciência da Universidade de Coimbra.
No Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) existe uma minuta do Protocolo que serviu de base a esta transferência de competências, no fundo do Professor José Mariano Gago.
FONTE:
Gago, José Mariano; Silva, João Gabriel (2011) Protocolo [minuta de protocolo entre o MCTES e a Universidade de Coimbra sobre entendimento e cooperação com o Museu Nacional de Ciência e da Técnica Mário Silva]. PT/FCT/MG/MCTES/005/0025. Arquivo de Ciência e Tecnologia. Lisboa, Portugal.
WEBGRAFIA:
Duarte, Adelaide Manuela da Costa (2007). O Museu Nacional da Ciência e da Técnica: no contexto da evolução da Museologia das Ciências: da ideia do Museu à sua oficialização (1971-1976). Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra. http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-0375-9
Silva, Mário Augusto (apresentação); Roque, João; Eduardo, José; Bringel, Linda; Alexandre, Júlio (realização) (1976, setembro 29) Museu Nacional da Ciência e da Técnica [programa de televisão]. Documentário, Lisboa, RTP arquivos.
LEGISLAÇÃO:
Decreto-Lei nº 347/1976, de 12 de maio. Diário da República. Série I(111).
Decreto-Lei nº 1/1984, de 12 de janeiro. Diário da República. Série I(1).
Decreto-Lei nº 379/1999, de 21 de setembro. Diário da República. Série I – A( 221).
Decreto-Lei nº 235/2002, de 2 de novembro. Diário da República. Série I-A(253).
Decreto-Lei nº 28/2012, de 8 de fevereiro. Diário da República. Série I(28).
Suzana Oliveira
Julho
Carta de 21 de março do Secretario de Estado da Investigação Científica referente a reunião da Comissão ocorrida a 02 de março de 1979.
Fonte: Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Uma Comissão Interministerial para a Ciência
A Comissão Interministerial para a Definição da Política de Investigação Científica foi criada em 1978 na Presidência do Conselho de Ministros, por Resolução do Conselho de Ministros (125/78 de 28 de julho) e visava uma tentativa de reunir, sob um mesmo órgão, as diferentes entidades da administração pública a atuar no âmbito da Ciência e Tecnologia (C&T).
As motivações para a sua criação refletiam os problemas e necessidades inerentes a uma reorganização da investigação, salientando a sua importância na sociedade. Havia necessidade de promover o desenvolvimento da atividade científica e tecnológica nacional o que justificaria a criação de uma superestrutura de apoio ao Governo de então, para a coordenação, planeamento e avaliação da atividade científica, funcionando como instrumento de desenvolvimento económico, social e cultural. Pretendia-se avaliar as potencialidades da cooperação internacional, através do estabelecimento de acordos bilaterais e a criação de programas de assistência técnica com organizações estrangeiras, explorando as possibilidades que poderiam advir de uma integração europeia.
À Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), criada em 1967, caberia o papel de poder orientar, coordenar e promover a produção, difusão e utilização dos conhecimentos científicos e tecnológicos, pela definição de políticas científicas e tecnológicas, onde fosse possível estabelecer um sistema de planificação e utilização de recursos cujo intuito seria o de melhorar progressivamente o processo de produção de C&T, assim como estabelecer a cooperação internacional.
Procurou instituir-se um “Alto Comissariado” com o intuito de criar um instrumento que permitisse ao Governo definir objetivos e afetar os meios necessários, de acordo com o mérito e relevância em atividade específica, para o desenvolvimento global do país. A decisão de se criar um alto comissariado, ficaria a dever-se à necessidade de permitir a continuidade da sua ação, sem dependência das “vicissitudes do poder político”.
A Presidência da Comissão pertencia ao Secretário de Estado da Investigação Científica, contando a Comissão com 16 comissários de diferentes áreas científicas, entre eles estavam José Mendes Mourão, José Veiga Simão, Eduardo Carrega Marçal Grilo, entre outros.
Num relatório preliminar da comissão foram apresentadas recomendações ao Governo e definiram-se as linhas gerais de uma estratégia que visava políticas de ciência como fatores de desenvolvimento económico, social e cultural, assim como uma preocupação na cooperação científica e técnica internacional que constituísse uma oportunidade de integração nas comunidades europeias. Tinha sobretudo como «linhas de ação, a ideia de implementar processos que visavam o planeamento e a coordenação de atividades de investigação nas áreas de maior importância económico-social, desenvolver uma infraestrutura institucional adequada aos objetivos gerais da política científica e tecnológica nacional e coordenar a intervenção do Estado no processo de importação de tecnologia e estimular a capacidade de transformação desta no sistema produtivo»
Propôs-se como medida institucional que houvesse um Conselho de Ministros restrito para temas de C&T e a quem deveria competir a definição das políticas nacionais, aprovar linhas de financiamento e aprovar um relatório de atividades anual, de Investigação e Desenvolvimento, a apresentar ao Secretário de Estado. Como fim último, foi proposto que a Secretaria de Estado da Investigação Científica ficasse na dependência do primeiro-ministro.
Em 1981, e sob a referência de estar em curso um exame à política de ciência e tecnologia no país, por resolução do Conselho de Ministros (117/81 de 5 de junho) extingue-se a Comissão.
Para mais informação sobre a atividade desta Comissão poderá ser consultada informação no Arquivo de Ciência e Tecnologia aqui.
Legislação:
Resolução da Presidência do Conselho de Ministros nº 125/78, de 12 de julho. Diário da República, Série I(172).
Resolução da Presidência do Conselho de Ministros nº 117/81, de 05 de junho. Diário da República, Série I(129).
Fontes:
Presidência do Conselho de Ministros. Gabinete do primeiro-ministro (1978, 12 de Julho) Resolução do Conselho de Ministros. Comissão Interministerial para a Definição de Política de Investigação Científica. PT/FCT/JNICT/DIR/004/0015. Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Lisboa. Portugal.
Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de estado do Ensino Superior e Investigação Científica. Gabinete do Secretário de Estado (1978, 16 de outubro). Acta da Reunião da Comissão Interministerial para a Definição da Política de Investigação Científica. Comissão Interministerial para a Definição de Política de Investigação Científica. PT/FCT/JNICT/DIR/004/0015. Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Lisboa. Portugal
Oliveira, Eduardo Arantes de (s.d.) Relatório Preliminar da Comissão Interministerial para a Definição da Política de Investigação Científica. Comissão Interministerial para a Definição de Política de Investigação Científica. PT/FCT/JNICT/DIR/004/0015. Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Lisboa. Portugal
Ministério da Educação e Investigação Científica. Secretaria de Estado do Ensino Superior e Investigação Científica. Gabinete do Secretário de Estado. (s.d.) [Proposta de criação do Alto Comissariado para a Ciência e Tecnologia]. Comissão Interministerial para a Definição de Política de Investigação Científica. PT/FCT/JNICT/DIR/004/0015. Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Lisboa. Portugal
Oliveira, Eduardo Arantes de, (1979) Comissão Interministerial para a Definição de Política de Investigação Científica, [carta de 21 de março]. Comissão Interministerial para a Definição de Política de Investigação Científica. PT/FCT/JNICT/DIR/004/0015. Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Lisboa. Portugal
Suzana Oliveira
Junho
Camões em 2024 (sem medo do passado nem do futuro).
Fonte: retrato do Poeta por Isabel Rio Novo recorrendo a um programa de Inteligência Artificial e a um designer. Imagem divulgada pela escritora no seu perfil no Facebook, 26.12.2023.
Camões nasceu há 500 anos
Investigadores da língua portuguesa e cientistas chegaram à conclusão de que a data de nascimento do nosso Camões foi 23 de janeiro de 1524. Esta conclusão teve por base a interpretação do soneto “O dia em que eu nasci moura e pereça” e a consulta, de um grupo de astrónomos da Universidade de Coimbra, às datas em que ocorreram todos os eclipses visíveis em Portugal entre 1524 e 1525. Já Mário Saa, em 1939, e o biógrafo do poeta, Manuel de Faria e Sousa, a partir de um documento relativo à sua inscrição de embarque para a Índia, em 1550, com a idade de 25 anos tinham considerado 1524 o ano do seu nascimento.
Quanto ao local de nascimento há quem reclame que nasceu no Norte, enquanto outros dão como certo que nasceu em Lisboa. Os que defendem que nasceu em Chaves justificam-se por haver registos de que antepassados seus viveram em Vilar de Nantes e que alguns deles estudaram em Braga.
Sabemos que foi soldado, prisioneiro e viajante, mas há dúvidas sobre a sua erudição em Latim, Literatura e Filosofia. Onde a terá conseguido? Possivelmente em Coimbra, com o seu tio D. Bento Camões, frade de Santa Cruz e chanceler da Universidade de Coimbra.
Passados 500 anos, e apesar de tantos que lhe sucederam, continuamos a achá-lo o nosso poeta maior. Aceite pela Inquisição que não lhe censurou nenhuma palavra e acarinhado pela ditadura que nos oprimiu no século XX, pela musicalidade dos seus versos continua a ser cantado. Os nossos fadistas consideram-no um dos seus, e ainda agora a fadista Lina resolveu cantá-lo no seu novo álbum “Fado Camões”, em português e em galego.
Faltou-lhe o reconhecimento em vida, mas depois dela a sua poesia foi considerada valiosa e de elevada construção estética por importantes da literatura europeia, o que lhe granjeou prestígio e divulgação pública que ainda não parou de crescer entre os que apreciam Literatura e os poetas que, por esse mundo fora, procuram inspiração na sua obra.
Camões, que foi o primeiro dos nossos com obra em português, ainda que tendo por modelo os poemas épicos dos clássicos gregos e romanos, é certamente dos autores mais traduzidos do mundo. Os seus Lusíadas estão traduzidos em muitas línguas, desde o esperanto ao mirandês.
O primeiro a publicar Camões foi António Gonçalves, em 1572, em Lisboa, mas as edições têm-se sucedido e uma das últimas foi feita em rosa e azul e ilustrada por mulheres que juntaram à arte do poeta as artes visuais.
Em junho será publicada mais uma biografia de Camões, escrita por Isabel Rio Novo e editada pela Contraponto, com o apoio do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua e da Fundação Oriente.
O Governo designou a 28 de dezembro de 2023, que o comissariado consultivo encarregado de definir até maio o programa para as comemorações dos 500 anos do nascimento de Luís de Camões fosse constituído pela comissária Rita Marnoto, professora catedrática da Universidade de Coimbra; e representantes do Camões, I.P., da Biblioteca Nacional de Portugal, da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas e da Direção-geral das Artes.
Por Resolução do Conselho de Ministros, de 29 de maio de 2024, foi nomeada a Estrutura de Missão para as comemorações do V Centenário do nascimento de Camões. A Comissária-Geral é Rita Marnoto e o Diretor-executivo, Vasco Silva.
No ACT é possível consultar teses de investigadores da língua portuguesa que escolheram a lírica camoniana para os seus trabalhos, bem como centros universitários com linhas de ação de promoção do estudo da obra de Camões.
Rosália Dias Lourenço
Webgrafia
Castro, Luís de (apresentador). (2024, março 1). Sociedade Civil: 500 anos de Camões [episódio de magazine de televisão]. Lisboa, RTP2.
Comunicado do Conselho de Ministros de 29 de maio de 2024. (2024, maio 29). Republica Portuguesa. Recuperado junho 1, 2024, de https://www.portugal.gov.pt/pt/gc24/governo/comunicado-do-conselho-de-ministros?i=615.
Contraponto (s.d.). Biografia de Luís de Camões: 500 anos depois, a mais completa e rigorosa abordagem à vida do poeta. [Nota de imprensa].
LUSA (2023, dezembro 28). Governo cria comissariado para comemorações dos 500 anos do nascimento de Camões, RTP Notícias.
LUSA e Almeida Mendes, Filipa (2024, janeiro 12). Um soneto e um eclipse solar indicam a data de nascimento de Camões, Público.
Redação (2023, junho 10). As origens transmontanas de Luís de Camões. A Voz de Trás-os-Montes.
Maio
Reunião do MUD no Teatro Taborda.
Fonte: Fotografia. (1945). Manuel Mendes/MNAC – Museu do Chiado, Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
Sabia que… Durante o Estado Novo houve um movimento de oposição ao regime, legal?
Estávamos em 1945, no rescaldo do final da II Guerra Mundial, as democracias ocidentais haviam vencido a guerra e os novos ventos ecoavam por toda a Europa.
Portugal, de alguma forma pressionado pelos governos do Reino Unido e dos Estados Unidos da América, dissolve a Assembleia Nacional e são marcadas eleições para o mês de novembro.
A União Nacional (UN) era, desde 1934, o único movimento político em Portugal, legal, que se apresentava a um ato eleitoral, monopolizando as intenções de voto. Para lhe fazer oposição, surge um movimento, saído de uma reunião autorizada a 08 de outubro de 1945, realizada no então Centro Republicano Almirante Reis, o Movimento de Unidade Democrática, que ficaria conhecido simplesmente por MUD. Em resultado desta reunião, o MUD definia como seus objetivos, a revisão à lei eleitoral para a realização de eleições livres e o restabelecimento de liberdades fundamentais, nomeadamente liberdade de expressão, de imprensa, de reunião e associação.
Nessa mesma reunião, onde foi possível recolher um número significativo de assinaturas, assim como em outros comícios organizados para o efeito das eleições que se aproximavam, permitiriam ao MUD apresentar-se a eleições em oposição à União Nacional. Porém, isso não viria a acontecer, pelo que o MUD faz circular um cartaz onde era possível ler-se «Sem Eleições Livres, Não Votes», tendo conseguido mobilizar uma grande massa populacional na época e fazer ouvir os seus ideais, ação que perturbou o regime que procedeu à suspensão das autorizações para a realização das reuniões e comícios do movimento, chegando mesmo a prender os elementos da Comissão Central do MUD, entre eles Ruy Luís Gomes ou Mário de Azevedo Gomes.
O MUD visava o debate público sobre a importância de eleições livres e procurava uma base de apoio nos ideais democráticos, fazendo referência ao artigo 8º da Constituição (de 1933), onde se lia nas primeiras alíneas, entre outros, o direito à liberdade.
O apoio popular que obtinha resultava de reuniões e comícios públicos, autorizados pelo regime e apoiado por alguma imprensa da época, nomeadamente o Diário de Lisboa ou o Rádio Clube Português. Defendia que deveria ser oposição sem recorrer à ilegalidade ou à clandestinidade, como faziam outros movimentos e partidos, como era o caso do MUNAF (Movimento de Unidade Anti Fascista) ou o Partido Comunista.
Entretanto o regime procura organizar-se e percebendo que a juventude se afastava da União Nacional realiza a «Primeira Conferência da União Nacional» a 9 de novembro de 1946. Esta conferência foi tema de debate numa sessão do MUD a 30 de novembro de 1946, onde membros do movimento apresentam números e dados sobre o estado de pobreza e miséria em que o país se encontrava. Entre eles estava Bento de Jesus Caraça, que apresenta uma comunicação sobre o estado da cultura, e que acaba por apresentar dados sobre o estado da educação em Portugal, reveladores da real falta de acesso ao ensino por parte da grande maioria da população. Também Fernando Fonseca, médico, apresenta uma comunicação sobre o estado da «Assistência», neste caso a saúde, inacessível à maioria da população, assim como o apoio na velhice. Também Mário Soares, ainda na qualidade de estudante, faz uma comunicação onde apresenta as razões pelas quais a juventude se afastava da UN.
É também no ano de 1946, impulsionado pelos ideais da Democracia defendidos pelo MUD, que surge nas camadas estudantis o MUD Juvenil onde integravam nomes como Júlio Pomar, Octávio Pato, Francisco Salgado Zenha, Mário Soares, entre outros.
Ainda no ano de 1946, e na sequência do veto da URSS à entrada de Portugal na Organização das Nações Unidas (ONU), o MUD endurece as críticas ao regime de Salazar, cuja recusa estava implícita na Comunidade Internacional, a integração do Estado numa ordem democrática. Esta aproximação à Comunidade Internacional foi feita sem que se divulgasse ao país, situação que o MUD contesta, e inicia-se então, e após uma tomada de posição em agosto desse ano, um processo no sentido de ilegalizar o MUD, sendo o movimento acusado de traição à Pátria e ordenando a prisão de alguns dos membros da Comissão Central, entre eles Bento de Jesus Caraça, Manuel Tito de Morais, entre outros.
É em abril de 1947 que o MUD é considerado um movimento ilegal, acusado de colaborar com o Partido Comunista, tido como um partido subordinado a um poder político estrangeiro, e associação secreta. Em março de 1948 é divulgado um manifesto como protesto contra a ilegalização do MUD, salientando-se os princípios que regiam o movimento, nomeadamente a luta por eleições livres e liberdades fundamentais, afirmando-se nesse documento que «o MUD é uma congregação de democratas feita em volta de reivindicações mínimas, e não mais do que isto». Assinam esse manifesto, entre outros, Maria Isabel de Aboim Inglês, António Sérgio, Bento de Jesus Caraça, Tito de Morais (almirante), Mário Soares, entre outros. Não assina Manuel Tito de Morais, por se encontrar preso naquela data.
No Arquivo de Ciência e Tecnologia temos alguma documentação referente à comemoração dos 50 anos do MUD Juvenil e ainda documentação relativa a Maria Isabel de Aboim Inglês, membro da Comissão Central do MUD.
Para a realização deste texto foi consultada documentação que está disponível online na Fundação Mário Soares Maria Barroso – Casa Comum, sobretudo a disponível no Arquivo de Alfredo Ribeiro dos Santos.
FONTES:
FMSMB/ ARQUIVO Alfredo Ribeiro dos Santos
A sessão de 30 de novembro de 1946 do Movimento de Unidade Democrática (1946). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos (pasta 02587.001.016), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
O MUD perante a admissão de Portugal na ONU (1946). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos (pasta 02587.001.005), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
Portugal fora das Nações Unidas. Representação da Comissão Central do MUD ao Senhor Presidente da República (1946). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos (pasta 02587.001.007), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
Representação ao Governo do MUD. (1948). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos, (pasta 02587.005.029), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
FMSMB/ ARQUIVO DMJ – Documentos 50º MUD Juvenil
Sem eleições livres não votes [Fotografia]. (1945). DMJ – Documentos 50º MUD Juvenil, (pasta, 02969.038.003) Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
FMSMB/ ARQUIVO Manuel Mendes
Reunião do MUD no Teatro Taborda [Fotografia]. (1945). Manuel Mendes/MNAC – Museu do Chiado, (Pasta 04651.187.000), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.
WEBGRAFIA
Movimento de Unidade Democrática (MUD). (s.d.). In Infopedia. Porto editora.
Suzana Oliveira
Abril
Complexo de Sines.
Fonte: imagem retirada de semmais digital
A propósito do desenvolvimento industrial antes e depois do 25 de Abril
Neste mês em que comemoramos o 50º aniversário da Revolução de Abril, o Arquivo de Ciência e Tecnologia divulga mais um dos seus fundos, o de José de Melo Torres Campos, que foi organizado pelo próprio no âmbito da sua atividade profissional, nos cargos públicos que ocupou relacionados com a produção industrial portuguesa, sobretudo nas décadas de 70 e 80 do século XX.
Esta documentação é testemunho da realidade nacional empresarial nos anos que antecederam a Revolução e nos imediatamente seguintes, bem como, representativa das funções desempenhadas por Torres Campos enquanto Diretor Geral dos Serviços Industriais, Diretor do Instituto Nacional de Investigação Industrial e Presidente do Conselho de Gerência da CIMPOR. Mais conhecido por ter sido o Comissário da Expo’98, este político e gestor, que também foi Secretário de Estado da Energia nos I, II e III governos provisórios, entre 1974 e 1975, conhecia bem a indústria portuguesa antes da Revolução e contribuiu para as políticas aplicadas no período pós-revolucionário.
Quando assumiu os primeiros cargos públicos, no fim dos anos sessenta, a realidade industrial do país contava com as chamadas indústrias tradicionais, com a dos têxteis à frente, logo seguida das indústrias dos adubos, cimentos, celuloses, siderurgia, metalomecânicas, material elétrico e refinação de petróleo. A documentação que nos legou foi organizada pelos temas Política Económica e Industrial; Outras Indústrias; Complexo de Sines; Cimenteiras; Setor Energético.
Com a substituição de Salazar por Marcello Caetano, em 1968, houve a possibilidade de uma mudança política, mas salvo algumas exceções de liberalização da Economia, o sistema político do Estado Novo manteve-se até à Revolução de Abril de 1974. Com a adesão à EFTA, as exportações de produtos têxteis passaram a ter grande importância na economia nacional. No caso da indústria refinadora de açúcar, existiam duas fábricas em Portugal, no Norte a RAR e no Sul a SIDUL. Abastecidas de matéria-prima vinda, sobretudo, de Moçambique, nem nas colónias se instalavam fábricas, nem em Portugal se cultivava beterraba e consequentemente não eram necessárias novas fábricas. Em relação à indústria automóvel houve uma tentativa gorada de instalação de uma fábrica de automóveis da Alfa Romeo, em Sines. Torres Campos, em representação do Governo português, participou em 1973 nestas negociações. Já o Setor Energético, por Despacho Ministerial de 16 de outubro de 1970, teve um plano de realizações no domínio da refinação de petróleos e da indústria petroquímica, a instalar em Portugal no período do IV Plano de Fomento, pois com o aumento do consumo de energia elétrica havia que aumentar a capacidade de produção, com os recursos nacionais hídricos e térmicos, construir centrais térmicas e aumentar as redes de transporte e distribuição de energia. O III Plano de Fomento (1968-1973) tinha confirmado a internacionalização da economia portuguesa, com o desenvolvimento da indústria privada como sector dominante da economia nacional e a subsequente consolidação dos grandes grupos económico-financeiros, bem como o crescimento do sector terciário, com o consequente incremento urbano. É por esta altura que se começa a inverter o sistema do condicionamento industrial por força da abertura aos mercados internacionais, e ao investimento estrangeiro, e que é instalada a infraestrutura portuária de grande dimensão que é o Porto de Sines e indústrias associadas. O Complexo de Sines foi criado nos anos 70 para garantir a autonomia da produção nacional no setor da energia e das matérias-primas. Quanto à indústria cimenteira, o monopólio do grupo de António Champalimaud manteve-se durante o Estado Novo. Assegurou a maior parte da produção, controlou os preços e teve a maior fábrica do país, em Alhandra.
Pouco depois da Revolução foi publicado a 9 de maio de 1975, o Dec. Lei 221-A/75 que formalizou a decisão do governo português de nacionalizar as cimenteiras existentes á data. Foi criada em 1976 a CIMPOR – Cimentos de Portugal E. P. (Dec. Lei 217-B/76, de 26 de março), pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com património próprio constituído com os bens, direitos e obrigações dos ativos e passivos das empresas nacionalizadas e com as ações nacionalizadas da empresa SECIL. Nestas empresas o capital social era português e de portugueses, no entanto a SECIL – Companhia Geral de Cal e Cimento, com uma fábrica em Setúbal, tinha capital social estrangeiro (cerca de 40% era dinamarquês).
No livro Memória do Portugal no meu Tempo, que Torres Campos escreveu, revela a sua opinião sobre a situação de Portugal, antes e depois da ditadura, e o seu conhecimento da História da Europa e da posição que Portugal escolheu ter nesta comunidade de países, a que tem pertencido de forma menos ou mais alargada. Considera que 1968 foi ano marcante na Europa e em Portugal, com o Maio de 68 e o crescimento dos partidos de esquerda e extrema esquerda, bem como o aparecimento dos Verdes, em França. Ao mesmo tempo que, em Portugal, Salazar deixava finalmente o poder, impossibilitado por doença, e para o substituir foi escolhido Marcello Caetano, que governou entre 1968 e 1974, manteve o regime ditatorial e a guerra no ultramar, mas promoveu mudanças na política económica, com alterações ao sistema salazarista do condicionamento industrial, e o desenvolvimento da economia portuguesa foi significativo. O condicionamento industrial, que até então tinha dificultado ou mesmo impossibilitado a existência de novos industriais, foi alterado e passou a haver concorrência não só a nível interno, mas também estrangeiro, com a abertura do nosso mercado aos investidores em geral.
O desenvolvimento industrial foi notório, as exportações cresceram e o PIB atingiu uma taxa nunca alcançada. A participação na EFTA tinha alterado o paradigma do comércio externo, que deixou de estar confinado às colónias portuguesas e foi alargado a vários países – Inglaterra, Suécia, Dinamarca, Noruega e Suíça que importavam têxteis, pasta de celulose, concentrado de tomate e produtos em cortiça.
Entretanto estava em preparação o IV Plano de Fomento, que não chegou a ter aplicação prática, mas foi revelador da evolução das políticas para o desenvolvimento da economia portuguesa. O primeiro plano de 1953/1958 pouco mais fora do que uma listagem de investimentos públicos, mas o plano intercalar de 1965/1967 já foi diferente e anunciou o que veio o a ser o III Plano de Fomento (1968-1973), um documento orientador das políticas económicas e industriais e um guia para a aplicação das mesmas.
Com a Revolução de Abril de 1974 e a instabilidade política que se lhe seguiu até às primeiras eleições democráticas de 1976, depois do governo do país ter sido assegurado por seis governos provisórios, na área económica o clima vivido foi de greves e saneamentos, nos setores privado e público.
Nos primeiros anos da democracia a situação da Economia portuguesa agravou-se devido ao aumento da despesa pública, à diminuição das exportações (diminuição da produção, falta de confiança dos compradores estrangeiros e perda do comércio com as ex-colónias), diminuição do turismo, fuga de capitais para o estrangeiro (sobretudo Brasil), aumento das importações (sobretudo petróleo, cujos preços tinham disparado nos anos setenta com duas crises nos países da OPEP). A agitação social que se viveu nestes tempos também se deu nas empresas e muitas delas foram nacionalizadas, desde o setor industrial ao setor financeiro, devido à perda de capacidade competitiva. Contrariamente ao que se verificou com as empresas tradicionalmente exportadoras, a indústria cimenteira teve um grande crescimento devido ao aumento da construção civil, que teve consequências graves no desordenamento do território por falta de adequado planeamento urbanístico.
Os primeiros anos do Portugal democrático ficaram ainda marcados pela desvalorização do escudo, moeda oficial à data, como forma de diminuir as importações, e a subida da taxa de inflação devido ao aumento do preço do petróleo; a intervenção do FMI que obrigou à redução da despesa pública, em Portugal tal recaiu no investimento público; o pedido de adesão à CEE em 1977, que foi formalizado no dia 1 de janeiro de 1986. Para Portugal, além do que esta adesão significava no plano económico, no plano político confirmava a representatividade da nossa democracia que, livre do passado colonialista, pertencia agora à Europa.
Torres Campos, de quem é possível saber mais pela sua biografia e Registo de Autoridade Arquivística, deixou para memória coletiva documentação representativa dos anos que antecederam a Revolução de Abril e dos primeiros anos do Portugal democrático que vos convidamos a conhecer em linha, através da descrição do Arquivo José de Melo Torres Campos, e presencialmente nas instalações do ACT, um espaço de conhecimento aberto diariamente para quem nos queira visitar.
Rosália Dias Lourenço
Referências Bibliográficas
Torres Campos, José (2011, janeiro). Memória do Portugal no meu tempo. Companhia das Cores.
Fonte
Arquivo de José de Melo Torres Campos (1895 – 2005). (PT/FCT/INII), Arquivo de Ciência e Tecnologia, Lisboa, Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Março
Maria Isabel Barreno (1939-2016) e o Dia Internacional da Mulher
Neste mês de março assinala-se o Dia Internacional da Mulher no próximo dia 8 e por isso decidimos lembrar e homenagear uma mulher, que de alguma forma, esteve ligada à Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Falamos de Maria Isabel Barreno de Faria Martins (1939-2016), que ficou conhecida como Maria Isabel Barreno, uma das autoras das Novas Cartas Portuguesas, publicadas em 1971, juntamente com Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta e cujo processo judicial que lhes esteve associado ficaria conhecido como o processo das «Três Marias».
Foi um processo que à época se transformou num processo mediático, nacional e internacional, de afirmação dos direitos das mulheres, não reconhecidos pelo ainda Estado Novo, apesar da «primavera Marcelista». Este processo teve repercussões internacionais tendo gerado críticas nos meios literários ingleses, franceses e americanos e só viria a ser concluído a 7 de maio de 1974, já depois do 25 de abril, com a absolvição das autoras e com o reconhecimento por parte do juiz, de que se tratava de uma obra de arte literária.
Numa entrevista para o Movimento Democrático de Mulheres (MDM) Maria Isabel Barreno viria a reconhecer a importância desta obra, sobretudo na influência da redação do texto da Constituição Portuguesa, onde se instituiu a «igualdade de direitos de todos os cidadãos, sem distinção de raça, sexo ou religião».
Curiosamente, faz este ano 20 anos que Maria Isabel Barreno foi agraciada com a Ordem do Infante D. Henrique, também a 8 de março, por serviços relevantes prestados ao país no âmbito da cultura portuguesa. Foi uma mulher, que pelo seu legado, sobretudo literário, ajudou a influenciar e transformar mentalidades num Portugal em transformação, muito pelas suas ideias feministas que viriam a ter uma maior expressão após o 25 de abril de 1974.
Licenciada em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1962, inicia no mesmo ano, funções no então Instituto Nacional de Investigação Industrial (INII), cujo fundo está à guarda do Arquivo de Ciência e Tecnologia (ACT) da FCT e onde trabalhou durante treze anos. Entrou como técnica de 3ª, tendo evoluído na carreira até técnica de 1ª e por fim como investigadora. Referiu, em entrevista ao MDM, que as desigualdades de género que sentiu não eram ao nível dos vencimentos ou promoções, apesar de os salários das mulheres serem inferiores aos dos homens, mas sim relacionadas com a dificuldade em conciliar a vida profissional com a vida familiar, referindo mesmo que o que havia naquela época eram as designadas «férias de parto», não mais do que quinze dias. Elaborou alguns estudos no INII, onde encontrava o papel das mulheres sempre relegado para a «invisibilidade» e que apesar de serem estudos inovadores, eram vistos como de pouca utilidade para a instituição.
Maria Isabel Barreno foi um dos rostos da luta pelos direitos das mulheres e do feminismo na segunda metade do século XX em Portugal. Publicou vasta obra literária, num total de 24 títulos, dos quais se destaca «A Morte da Mãe» ou «De Noite As Árvores são Negras», entre outros. Recebeu vários prémios, nomeadamente o prémio Camilo Castelo Branco e o prémio Pen Club para o livro de contos «Sensos Incomuns» e ainda, o prémio Fernando Namora para o romance «Crónica do Tempo».
Foi também jornalista, tendo sido chefe de redação da revista Marie Claire, assim como coordenadora a nível institucional do ensino da língua portuguesa em França e conselheira cultural da embaixada portuguesa em Paris entre 1997 e 2003.
Nascida a 10 de julho de 1939, viria a falecer em Lisboa a 3 de setembro de 2016.
Suzana Oliveira
Referências Bibliográficas
Cipriano, Rita (2016, setembro 03). Morreu Maria Isabel Barreno, feroz defensora dos direitos das mulheres. Observador
Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, CIG (2016, setembro 05). Maria Isabel Barreno (1939-2016).
Coutinho, Isabel (2016, setembro 03). Morreu Maria Isabel Barreno, que foi mais do que uma das «Três Marias». Público
Movimento Democrático de Mulheres, MDM (2017, novembro). Mulheres de Abril, Maria Isabel Barreno.
Porto Editora (s.d.). Maria Isabel Barreno. Biografia.
Silva, João Céu e (2016, setembro 04). Morre Isabel Barreno, uma das Três Marias que mudaram Portugal. Diário de Notícias.
Fonte
Arquivo do Instituto Nacional de Investigação Industrial. (1959 – 1980). (PT/FCT/INII), Arquivo de Ciência e Tecnologia, Lisboa, Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Fevereiro
Sabia que os Planos de Fomento fizeram 70 anos?
Os Planos de Fomento foram os mecanicismos dinamizadores da economia nacional do Pós-II Guerra Mundial e da descolonização e tiveram um impacto muito grande na economia portuguesa da época contribuindo para o crescimento económico e para a industrialização do país.
Incorporavam planos de investimentos de obras públicas, como por exemplo portos, aeroportos, etc., e também a criação de empresas que incluíam capitais privados tais como a TAP, a RTP, entre outras. Contemplavam um conjunto de medidas obrigatórias para o sector público e medidas de enquadramento para o sector privado com um caráter meramente indicativo (Carlos & Escorrega, 2015).
Foram implementados 4 planos de fomento com uma duração de seis anos e um plano intercalar com uma duração de três anos, sendo que o primeiro foi estabelecido em 1953. Os planos de fomento tiveram uma abrangência de 26 anos com a seguinte distribuição:
- I Plano de Fomento (vigorou entre 1953 e 1958):
Este plano, aprovado pela lei nº 2058, de 29 de dezembro de 1952, apresentou um conjunto de investimentos direcionados para a construção de infraestruturas e indústrias de base. Contudo não representava, ainda, um corte profundo com os interesses rurais porque nesta fase a industrialização ainda estava dependente do crescimento da agricultura (Caeiro, 2005). Esta estratégia começou a ser esboçada com a Lei de Fomento e Reorganização Industrial, em 1945, e ganhou estrutura neste Primeiro Plano de Fomento (Bastien & Nunes, 2019).
Não foi muito além de uma lista de investimentos tal como havia acontecido com a Lei de Reconstituição Económica que vigorou entre 1935 e 1950 (Gonçalves, 2020) e , no programa de investimentos não contemplou qualquer investimento de apoio à investigação.
- II Plano de Fomento (compreendeu o período entre 1959 e 1964):
O segundo plano não introduziu grandes novidades em relação ao plano anterior, apesar de prever mais investimentos em novos setores (por exemplo, o setor pesqueiro na metrópole) (Ferraz, 2019). Este plano foi aprovado pela Lei nº 2094, de 25 de novembro de 1958.
Veio associado a uma maior abertura da economia portuguesa, que passou pela adesão de Portugal à Associação Europeia do Comércio Livre (EFTA), ao Fundo Monetário Internacional (FMI), ao Banco Mundial (BM) e ao Acordo geral de Tarifas e Comércio (GATT), contribuindo para a aceleração do crescimento e do processo de industrialização, sem deixar de acentuar algumas fragilidades normais de uma economia dependente, nomeadamente em termos financeiros e tecnológicos (Bastien & Nunes, 2019).
O orçamento do II plano contemplava uma rubrica para investigação e ensino técnico dedicando um total de 238.000 contos para investigação aplicada.
- O Plano Intercalar (decorreu entre 1965 e 1967):
Com o plano intercalar surge pela primeira vez a preocupação com o planeamento regional e com uma distribuição mais equitativa do rendimento (Bastien & Nunes, 2019).
Aprovado pela Lei nº 2123, de 14 de dezembro de 1964, representa o despertar da necessidade de liberalização do comércio externo e de as empresas enfrentarem a concorrência externa, estratégia que estava alinhada com o sistema económico misto presente nas economias europeias mais desenvolvidas. Contudo, este período de grande abertura externa sustentou o crescimento económico havendo uma notória aproximação económica relativamente aos países europeus mais desenvolvidos (Bastien & Nunes, 2019).
O plano intercalar dedicou o capítulo VII ao ensino e investigação contemplando um investimento total de 874.000 contos.
- III Plano de Fomento (abrangeu os anos de 1968 a 73):
O terceiro Plano de Fomento, no qual emergiu uma nova política industrial, foi aprovado pela Lei nº 2133, de 20 de dezembro de 1967, inicia-se durante o governo de Marcelo Caetano e surge como uma continuidade do plano intercalar.
Neste plano reconhece-se a necessidade de deixar cair o modelo de crescimento que tinha por base a orientação interna denominada de inward orientation, substituindo-a por uma visão focada nas vantagens comparativas e na concorrência internacional, numa tentativa de modernização do tecido industrial e redefinição do sector industrial (Carlos & Escorrega, 2015).
Neste plano mantém-se a preocupação com o investimento em investigação sendo o capítulo X dedicado ao ensino e investigação. Neste caso este capítulo divide-se em secções sendo a primeira dedicada à educação e investigação ligada ao ensino e a segunda à investigação não ligada ao ensino.
- IV Plano de Fomento (destinava-se ao período de 1974 a 1979, mas apenas teve um ano de execução):
O quarto plano estipulou maiores investimentos em diversos setores da metrópole e das províncias ultramarinas, mas também apresentou previsões económicas mais detalhadas para uma gama mais ampla de indicadores. Incluiu também vários estudos que analisaram as questões das assimetrias regionais e das relações externas de Portugal no contexto da integração europeia (Ferraz, 2019).
Este último plano, aprovado pela Lei nº 8, de 26 de dezembro de 1973, foi o mais elaborado de todos, embora tenha sido o único que não teve praticamente nenhuma implementação financeira, uma vez que, depois do 25 de Abril de 1974, que derrubou o regime do Estado Novo, foi promulgado o Decreto-Lei nº 203/74, prevendo a imediata revisão deste plano. Contudo, em vez de uma revisão, que consiste numa atualização à luz de acontecimentos internos e externos, o quarto plano foi abandonado. Esta decisão marcou o fim dos planos de desenvolvimento em Portugal (Ferraz, 2019).
Neste plano o capítulo XII era dedicado à investigação e desenvolvimento tecnológico e estava dividido em alíneas que contemplavam estratégias de desenvolvimento, programação de ações a desenvolver, os domínios prioritários de investigação e a informação científica e técnica.
A Biblioteca da FCT possui uma coleção bibliográfica dos Planos de Fomento, constituída, na sua maioria, por relatórios e estudos relativos ao planeamento, à execução e ao acompanhamento dos Planos de Fomento. Podem pesquisar no nosso catálogo toda a documentação que integra esta coleção.
A biblioteca da FCT criou uma lista pública que engloba toda a documentação que compõe a coleção Planos de Fomento. Pode consultar os registos, fazer download da lista ou imprimir. Todos os recursos bibliográficos que integram a lista estão disponíveis para consulta na Biblioteca.
Paula Seguro de Carvalho
Referências Bibliográficas
Bastien, C., & Nunes, A. B. (2019). A evolução da economia do desenvolvimento: ensaio sobre o caso português (61; Série Documentos de Trabalho. Working Papers Series).
Caeiro, J. (2005). Os planos de fomento nacional no contexto do desenvolvimento económico nacional no pós guerra. Intervenção Social, 31, 193–219.
Carlos, L., & Escorrega, F. (2015). Da evolução da economia portuguesa no período da guerra do ultramar. Revista de Ciências Militares, III(1), 411–430.
Ferraz, R. (2019). The Portuguese development plans in the postwar period: How much was spent and where? Investigaciones de Historia Económica, 15(3), 1–11.
Gonçalves, N. I. (2020, August 26). Saudades do Plano de Fomento. Jornal Tornado Online.
Janeiro
Sabia que…
A 8 de janeiro de 1851 ficou demonstrado publicamente o movimento de rotação da terra?
O responsável por esta demonstração científica foi um físico francês chamado Jean Bernard León Foucault (1819-1868) que desenvolveu o seu trabalho com base em experiências científicas e tecnológicas, sobretudo no domínio da eletricidade, tendo desenvolvido técnicas para uma atividade que veio a ser conhecida como a Eletrotecnia.
Os trabalhos que desenvolveu, envolvendo eletricidade, correspondem a uma pequena parte de um conjunto de experiências e estudos que efetuou ao longo da sua vida. Nascido a 18 de setembro de 1819 em Paris, recebeu formação através de professores particulares e em 1839 inscreve-se na Escola de Medicina e da qual viria a desistir após ter frequentado um curso de Microscopia com aplicação de fotografia, através da utilização do daguerreótipo em experiências científicas. Inicia então um período de formação autodidata em Física e Mecânica sob influência de Alfred Donné com quem vem a publicar um Atlas para o curso de microscopia.
Em 1844 Alfred Donné e Foucault apresentam à Academia de Ciências de Paris um aparelho destinado a demonstrações microscópicas que era iluminado por ação do arco voltaico, tendo sido designado por microscópio fotoelétrico. Para além da utilização do microscópio fotoelétrico, desenvolveu também, a par com Hippolyte Fizeau, um aparelho de iluminação com arco elétrico que ficou conhecido por lâmpada fotoelétrica e que foi adaptado a outros instrumentos no âmbito de estudos desenvolvidos na área da Ótica entre 1843 e 1849.
De entre muitas experiências e desenvolvimento de técnicas exploradas por Foucault, o que lhe veio a dar notoriedade pública foi, por um lado, em 1851, a demonstração pública do movimento diurno da terra, e por outro, em 1862 a determinação da velocidade da luz.
De facto, a experiência de que falamos realizou-se primeiro numa sala do Observatório de Paris, para uma audiência de membros da Academia de Ciências de Paris e só depois a demonstração pública, já no Pantheón, durante a Feira Mundial de 1851, o que transformou a experiência num acontecimento nacional. A ideia surgiu enquanto empregava um pêndulo para criar um relógio usado para controlar telescópios, deparou-se então com a ideia de aplicar a técnica para provar que a Terra gira em torno do seu próprio eixo. Para esse efeito, Foucault na sua demonstração, utilizou um cabo de aço de 67 metros e uma esfera de bronze de 28 quilos, instrumento que ficaria conhecido como «Pêndulo de Foucault» e cujo original está exposto no Musée des Arts e Métiers em França.
Foucault baseou a sua demonstração numa das Leis de Newton que refere que um corpo, quando colocado em movimento, move-se em linha reta a partir da sua origem, desde que não seja influenciado por forças externas. Conseguiu desta forma, demonstrar pela primeira vez em público, que apesar de o pêndulo parecer mudar de direção durante o dia, era na realidade o chão que girava sob o pêndulo.
León Foucault foi um homem do seu tempo, onde a experimentação e descobertas científicas aconteciam com alguma relevância. Realizou inúmeras experiências importantes e contribuiu e criou alguns instrumentos, a que se associa, por exemplo, o giroscópio em 1852, tendo dado um enorme contributo no estudo e aplicação da eletricidade e outros domínios da Física, no século XIX.
Bom Ano a todos.
Suzana Oliveira
Webgrafia:
Camenietzki, Carlos Ziller (2001, abril). A Incessante mobilidade da terra. Ciência Hoje, 29, 78-79.
Davidson, Michael W. (2015, maio 13). Jean Bernard León Foucault (1819-1868). Molecular expressions. Science, optics & you. Pioneers in optics.
EnsinoTv (2018, novembro 10). Experiência do Pêndulo de Foucault [Vídeo]. Youtube.
Guedes, Manuel Vaz (2001, dezembro 5). León Foucault: um electrotécnico precursor. Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.
Oxford Reference (2024). Jean Bernard León Foucault (1818-1868) French physicist. Oxford University Press.
Portal São Francisco (s.d.). Pêndulo de Foucault. Recuperado a 20 de dezembro de 2023.