Factos e Curiosidades

Ano de 2024

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Maio

Reunião do MUD no Teatro Taborda.
Fonte: Fotografia. (1945). Manuel Mendes/MNAC – Museu do Chiado, Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

Sabia que… Durante o Estado Novo houve um movimento de oposição ao regime, legal?

Estávamos em 1945, no rescaldo do final da II Guerra Mundial, as democracias ocidentais haviam vencido a guerra e os novos ventos ecoavam por toda a Europa.

Portugal, de alguma forma pressionado pelos governos do Reino Unido e dos Estados Unidos da América, dissolve a Assembleia Nacional e são marcadas eleições para o mês de novembro.

A União Nacional (UN) era, desde 1934, o único movimento político em Portugal, legal, que se apresentava a um ato eleitoral, monopolizando as intenções de voto. Para lhe fazer oposição, surge um movimento, saído de uma reunião autorizada a 08 de outubro de 1945, realizada no então Centro Republicano Almirante Reis, o Movimento de Unidade Democrática, que ficaria conhecido simplesmente por MUD. Em resultado desta reunião, o MUD definia como seus objetivos, a revisão à lei eleitoral para a realização de eleições livres e o restabelecimento de liberdades fundamentais, nomeadamente liberdade de expressão, de imprensa, de reunião e associação.

Nessa mesma reunião, onde foi possível recolher um número significativo de assinaturas, assim como em outros comícios organizados para o efeito das eleições que se aproximavam, permitiriam ao MUD apresentar-se a eleições em oposição à União Nacional. Porém, isso não viria a acontecer, pelo que o MUD faz circular um cartaz onde era possível ler-se «Sem Eleições Livres, Não Votes», tendo conseguido mobilizar uma grande massa populacional na época e fazer ouvir os seus ideais, ação que perturbou o regime que procedeu à suspensão das autorizações para a realização das reuniões e comícios do movimento, chegando mesmo a prender os elementos da Comissão Central do MUD, entre eles Ruy Luís Gomes ou Mário de Azevedo Gomes.

O MUD visava o debate público sobre a importância de eleições livres e procurava uma base de apoio nos ideais democráticos, fazendo referência ao artigo 8º da Constituição (de 1933), onde se lia nas primeiras alíneas, entre outros, o direito à liberdade.

O apoio popular que obtinha resultava de reuniões e comícios públicos, autorizados pelo regime e apoiado por alguma imprensa da época, nomeadamente o Diário de Lisboa ou o Rádio Clube Português. Defendia que deveria ser oposição sem recorrer à ilegalidade ou à clandestinidade, como faziam outros movimentos e partidos, como era o caso do MUNAF (Movimento de Unidade Anti Fascista) ou o Partido Comunista.

Entretanto o regime procura organizar-se e percebendo que a juventude se afastava da União Nacional realiza a «Primeira Conferência da União Nacional» a 9 de novembro de 1946. Esta conferência foi tema de debate numa sessão do MUD a 30 de novembro de 1946, onde membros do movimento apresentam números e dados sobre o estado de pobreza e miséria em que o país se encontrava. Entre eles estava Bento de Jesus Caraça, que apresenta uma comunicação sobre o estado da cultura, e que acaba por apresentar dados sobre o estado da educação em Portugal, reveladores da real falta de acesso ao ensino por parte da grande maioria da população. Também Fernando Fonseca, médico, apresenta uma comunicação sobre o estado da «Assistência», neste caso a saúde, inacessível à maioria da população, assim como o apoio na velhice. Também Mário Soares, ainda na qualidade de estudante, faz uma comunicação onde apresenta as razões pelas quais a juventude se afastava da UN.

É também no ano de 1946, impulsionado pelos ideais da Democracia defendidos pelo MUD, que surge nas camadas estudantis o MUD Juvenil onde integravam nomes como Júlio Pomar, Octávio Pato, Francisco Salgado Zenha, Mário Soares, entre outros.

Ainda no ano de 1946, e na sequência do veto da URSS à entrada de Portugal na Organização das Nações Unidas (ONU), o MUD endurece as críticas ao regime de Salazar, cuja recusa estava implícita na Comunidade Internacional, a integração do Estado numa ordem democrática. Esta aproximação à Comunidade Internacional foi feita sem que se divulgasse ao país, situação que o MUD contesta, e inicia-se então, e após uma tomada de posição em agosto desse ano, um processo no sentido de ilegalizar o MUD, sendo o movimento acusado de traição à Pátria e ordenando a prisão de alguns dos membros da Comissão Central, entre eles Bento de Jesus Caraça, Manuel Tito de Morais, entre outros.

É em abril de 1947 que o MUD é considerado um movimento ilegal, acusado de colaborar com o Partido Comunista, tido como um partido subordinado a um poder político estrangeiro, e associação secreta.  Em março de 1948 é divulgado um manifesto como protesto contra a ilegalização do MUD, salientando-se os princípios que regiam o movimento, nomeadamente a luta por eleições livres e liberdades fundamentais, afirmando-se nesse documento que «o MUD é uma congregação de democratas feita em volta de reivindicações mínimas, e não mais do que isto». Assinam esse manifesto, entre outros, Maria Isabel de Aboim Inglês, António Sérgio, Bento de Jesus Caraça, Tito de Morais (almirante), Mário Soares, entre outros. Não assina Manuel Tito de Morais, por se encontrar preso naquela data.

No Arquivo de Ciência e Tecnologia temos alguma documentação referente à comemoração dos 50 anos do MUD Juvenil e ainda documentação relativa a Maria Isabel de Aboim Inglês, membro da Comissão Central do MUD.

Para a realização deste texto foi consultada documentação que está disponível online na Fundação Mário Soares Maria Barroso – Casa Comum, sobretudo a disponível no Arquivo de Alfredo Ribeiro dos Santos.

FONTES:

FMSMB/ ARQUIVO Alfredo Ribeiro dos Santos

A sessão de 30 de novembro de 1946 do Movimento de Unidade Democrática (1946). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos (pasta 02587.001.016), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

O MUD perante a admissão de Portugal na ONU (1946). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos (pasta 02587.001.005), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

Portugal fora das Nações Unidas. Representação da Comissão Central do MUD ao Senhor Presidente da República (1946). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos (pasta 02587.001.007), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

Representação ao Governo do MUD. (1948). DRS – Documentos Alfredo Ribeiro dos Santos, (pasta 02587.005.029), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

FMSMB/ ARQUIVO DMJ – Documentos 50º MUD Juvenil

Sem eleições livres não votes [Fotografia]. (1945). DMJ – Documentos 50º MUD Juvenil, (pasta, 02969.038.003) Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

FMSMB/ ARQUIVO Manuel Mendes

Reunião do MUD no Teatro Taborda [Fotografia]. (1945). Manuel Mendes/MNAC – Museu do Chiado, (Pasta 04651.187.000), Fundação Mário Soares, Lisboa, Portugal.

WEBGRAFIA

Movimento de Unidade Democrática (MUD). (s.d.). In Infopedia. Porto editora.

Suzana Oliveira

Abril

Complexo de Sines.
Fonte: imagem retirada de semmais digital

A propósito do desenvolvimento industrial antes e depois do 25 de Abril

Neste mês em que comemoramos o 50º aniversário da Revolução de Abril, o Arquivo de Ciência e Tecnologia divulga mais um dos seus fundos, o de José de Melo Torres Campos, que foi organizado pelo próprio no âmbito da sua atividade profissional, nos cargos públicos que ocupou relacionados com a produção industrial portuguesa, sobretudo nas décadas de 70 e 80 do século XX.

Esta documentação é testemunho da realidade nacional empresarial nos anos que antecederam a Revolução e nos imediatamente seguintes, bem como, representativa das funções desempenhadas por Torres Campos enquanto Diretor Geral dos Serviços Industriais, Diretor do Instituto Nacional de Investigação Industrial e Presidente do Conselho de Gerência da CIMPOR. Mais conhecido por ter sido o Comissário da Expo’98, este político e gestor, que também foi Secretário de Estado da Energia nos I, II e III governos provisórios, entre 1974 e 1975, conhecia bem a indústria portuguesa antes da Revolução e contribuiu para as políticas aplicadas no período pós-revolucionário.

Quando assumiu os primeiros cargos públicos, no fim dos anos sessenta, a realidade industrial do país contava com as chamadas indústrias tradicionais, com a dos têxteis à frente, logo seguida das indústrias dos adubos, cimentos, celuloses, siderurgia, metalomecânicas, material elétrico e refinação de petróleo. A documentação que nos legou foi organizada pelos temas Política Económica e Industrial; Outras Indústrias; Complexo de Sines; Cimenteiras; Setor Energético.

Com a substituição de Salazar por Marcello Caetano, em 1968, houve a possibilidade de uma mudança política, mas salvo algumas exceções de liberalização da Economia, o sistema político do Estado Novo manteve-se até à Revolução de Abril de 1974. Com a adesão à EFTA, as exportações de produtos têxteis passaram a ter grande importância na economia nacional. No caso da indústria refinadora de açúcar, existiam duas fábricas em Portugal, no Norte a RAR e no Sul a SIDUL. Abastecidas de matéria-prima vinda, sobretudo, de Moçambique, nem nas colónias se instalavam fábricas, nem em Portugal se cultivava beterraba e consequentemente não eram necessárias novas fábricas. Em relação à indústria automóvel houve uma tentativa gorada de instalação de uma fábrica de automóveis da Alfa Romeo, em Sines. Torres Campos, em representação do Governo português, participou em 1973 nestas negociações. Já o Setor Energético, por Despacho Ministerial de 16 de outubro de 1970, teve um plano de realizações no domínio da refinação de petróleos e da indústria petroquímica, a instalar em Portugal no período do IV Plano de Fomento, pois com o aumento do consumo de energia elétrica havia que aumentar a capacidade de produção, com os recursos nacionais hídricos e térmicos, construir centrais térmicas e aumentar as redes de transporte e distribuição de energia. O III Plano de Fomento (1968-1973) tinha confirmado a internacionalização da economia portuguesa, com o desenvolvimento da indústria privada como sector dominante da economia nacional e a subsequente consolidação dos grandes grupos económico-financeiros, bem como o crescimento do sector terciário, com o consequente incremento urbano. É por esta altura que se começa a inverter o sistema do condicionamento industrial por força da abertura aos mercados internacionais, e ao investimento estrangeiro, e que é instalada a infraestrutura portuária de grande dimensão que é o Porto de Sines e indústrias associadas. O Complexo de Sines foi criado nos anos 70 para garantir a autonomia da produção nacional no setor da energia e das matérias-primas. Quanto à indústria cimenteira, o monopólio do grupo de António Champalimaud manteve-se durante o Estado Novo. Assegurou a maior parte da produção, controlou os preços e teve a maior fábrica do país, em Alhandra.

Pouco depois da Revolução foi publicado a 9 de maio de 1975, o Dec. Lei 221-A/75 que formalizou a decisão do governo português de nacionalizar as cimenteiras existentes á data. Foi criada em 1976 a CIMPOR – Cimentos de Portugal E. P. (Dec. Lei 217-B/76, de 26 de março), pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com património próprio constituído com os bens, direitos e obrigações dos ativos e passivos das empresas nacionalizadas e com as ações nacionalizadas da empresa SECIL. Nestas empresas o capital social era português e de portugueses, no entanto a SECIL – Companhia Geral de Cal e Cimento, com uma fábrica em Setúbal, tinha capital social estrangeiro (cerca de 40% era dinamarquês).

No livro Memória do Portugal no meu Tempo, que Torres Campos escreveu, revela a sua opinião sobre a situação de Portugal, antes e depois da ditadura, e o seu conhecimento da História da Europa e da posição que Portugal escolheu ter nesta comunidade de países, a que tem pertencido de forma menos ou mais alargada. Considera que 1968 foi ano marcante na Europa e em Portugal, com o Maio de 68 e o crescimento dos partidos de esquerda e extrema esquerda, bem como o aparecimento dos Verdes, em França. Ao mesmo tempo que, em Portugal, Salazar deixava finalmente o poder, impossibilitado por doença, e para o substituir foi escolhido Marcello Caetano, que governou entre 1968 e 1974, manteve o regime ditatorial e a guerra no ultramar, mas promoveu mudanças na política económica, com alterações ao sistema salazarista do condicionamento industrial, e o desenvolvimento da economia portuguesa foi significativo.  O condicionamento industrial, que até então tinha dificultado ou mesmo impossibilitado a existência de novos industriais, foi alterado e passou a haver concorrência não só a nível interno, mas também estrangeiro, com a abertura do nosso mercado aos investidores em geral.

O desenvolvimento industrial foi notório, as exportações cresceram e o PIB atingiu uma taxa nunca alcançada. A participação na EFTA tinha alterado o paradigma do comércio externo, que deixou de estar confinado às colónias portuguesas e foi alargado a vários países – Inglaterra, Suécia, Dinamarca, Noruega e Suíça que importavam têxteis, pasta de celulose, concentrado de tomate e produtos em cortiça.

Entretanto estava em preparação o IV Plano de Fomento, que não chegou a ter aplicação prática, mas foi revelador da evolução das políticas para o desenvolvimento da economia portuguesa. O primeiro plano de 1953/1958 pouco mais fora do que uma listagem de investimentos públicos, mas o plano intercalar de 1965/1967 já foi diferente e anunciou o que veio o a ser o III Plano de Fomento (1968-1973), um documento orientador das políticas económicas e industriais e um guia para a aplicação das mesmas.

Com a Revolução de Abril de 1974 e a instabilidade política que se lhe seguiu até às primeiras eleições democráticas de 1976, depois do governo do país ter sido assegurado por seis governos provisórios, na área económica o clima vivido foi de greves e saneamentos, nos setores privado e público.

Nos primeiros anos da democracia a situação da Economia portuguesa agravou-se devido ao aumento da despesa pública, à diminuição das exportações (diminuição da produção, falta de confiança dos compradores estrangeiros e perda do comércio com as ex-colónias), diminuição do turismo, fuga de capitais para o estrangeiro (sobretudo Brasil), aumento das importações (sobretudo petróleo, cujos preços tinham disparado nos anos setenta com duas crises nos países da OPEP). A agitação social que se viveu nestes tempos também se deu nas empresas e muitas delas foram nacionalizadas, desde o setor industrial ao setor financeiro, devido à perda de capacidade competitiva. Contrariamente ao que se verificou com as empresas tradicionalmente exportadoras, a indústria cimenteira teve um grande crescimento devido ao aumento da construção civil, que teve consequências graves no desordenamento do território por falta de adequado planeamento urbanístico.

Os primeiros anos do Portugal democrático ficaram ainda marcados pela desvalorização do escudo, moeda oficial à data, como forma de diminuir as importações, e a subida da taxa de inflação devido ao aumento do preço do petróleo; a intervenção do FMI que obrigou à redução da despesa pública, em Portugal tal recaiu no investimento público; o pedido de adesão à CEE em 1977, que foi formalizado no dia 1 de janeiro de 1986. Para Portugal, além do que esta adesão significava no plano económico, no plano político confirmava a representatividade da nossa democracia que, livre do passado colonialista, pertencia agora à Europa.

Torres Campos, de quem é possível saber mais pela sua biografia e Registo de Autoridade Arquivística, deixou para memória coletiva documentação representativa dos anos que antecederam a Revolução de Abril e dos primeiros anos do Portugal democrático que vos convidamos a conhecer em linha, através da descrição do Arquivo José de Melo Torres Campos, e presencialmente nas instalações do ACT, um espaço de conhecimento aberto diariamente para quem nos queira visitar.

Rosália Dias Lourenço

Referências Bibliográficas

Torres Campos, José (2011, janeiro). Memória do Portugal no meu tempo. Companhia das Cores.

Fonte

Arquivo de José de Melo Torres Campos (1895 – 2005). (PT/FCT/INII), Arquivo de Ciência e Tecnologia, Lisboa, Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Março

Maria Isabel Barreno (1939-2016) e o Dia Internacional da Mulher

Neste mês de março assinala-se o Dia Internacional da Mulher no próximo dia 8 e por isso decidimos lembrar e homenagear uma mulher, que de alguma forma, esteve ligada à Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Falamos de Maria Isabel Barreno de Faria Martins (1939-2016), que ficou conhecida como Maria Isabel Barreno, uma das autoras das Novas Cartas Portuguesas, publicadas em 1971, juntamente com Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta e cujo processo judicial que lhes esteve associado ficaria conhecido como o processo das «Três Marias».

Foi um processo que à época se transformou num processo mediático, nacional e internacional, de afirmação dos direitos das mulheres, não reconhecidos pelo ainda Estado Novo, apesar da «primavera Marcelista». Este processo teve repercussões internacionais tendo gerado críticas nos meios literários ingleses, franceses e americanos e só viria a ser concluído a 7 de maio de 1974, já depois do 25 de abril, com a absolvição das autoras e com o reconhecimento por parte do juiz, de que se tratava de uma obra de arte literária.

Numa entrevista para o Movimento Democrático de Mulheres (MDM) Maria Isabel Barreno viria a reconhecer a importância desta obra, sobretudo na influência da redação do texto da Constituição Portuguesa, onde se instituiu a «igualdade de direitos de todos os cidadãos, sem distinção de raça, sexo ou religião».

Curiosamente, faz este ano 20 anos que Maria Isabel Barreno foi agraciada com a Ordem do Infante D. Henrique, também a 8 de março, por serviços relevantes prestados ao país no âmbito da cultura portuguesa. Foi uma mulher, que pelo seu legado, sobretudo literário, ajudou a influenciar e transformar mentalidades num Portugal em transformação, muito pelas suas ideias feministas que viriam a ter uma maior expressão após o 25 de abril de 1974.

Licenciada em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1962, inicia no mesmo ano, funções no então Instituto Nacional de Investigação Industrial (INII), cujo fundo está à guarda do Arquivo de Ciência e Tecnologia (ACT) da FCT e onde trabalhou durante treze anos. Entrou como técnica de 3ª, tendo evoluído na carreira até técnica de 1ª e por fim como investigadora. Referiu, em entrevista ao MDM, que as desigualdades de género que sentiu não eram ao nível dos vencimentos ou promoções, apesar de os salários das mulheres serem inferiores aos dos homens, mas sim relacionadas com a dificuldade em conciliar a vida profissional com a vida familiar, referindo mesmo que o que havia naquela época eram as designadas «férias de parto», não mais do que quinze dias. Elaborou alguns estudos no INII, onde encontrava o papel das mulheres sempre relegado para a «invisibilidade» e que apesar de serem estudos inovadores, eram vistos como de pouca utilidade para a instituição.

Maria Isabel Barreno foi um dos rostos da luta pelos direitos das mulheres e do feminismo na segunda metade do século XX em Portugal. Publicou vasta obra literária, num total de 24 títulos, dos quais se destaca «A Morte da Mãe» ou «De Noite As Árvores são Negras», entre outros. Recebeu vários prémios, nomeadamente o prémio Camilo Castelo Branco e o prémio Pen Club para o livro de contos «Sensos Incomuns» e ainda, o prémio Fernando Namora para o romance «Crónica do Tempo».

Foi também jornalista, tendo sido chefe de redação da revista Marie Claire, assim como coordenadora a nível institucional do ensino da língua portuguesa em França e conselheira cultural da embaixada portuguesa em Paris entre 1997 e 2003.

Nascida a 10 de julho de 1939, viria a falecer em Lisboa a 3 de setembro de 2016.

Suzana Oliveira

Referências Bibliográficas

Cipriano, Rita (2016, setembro 03). Morreu Maria Isabel Barreno, feroz defensora dos direitos das mulheres. Observador

Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, CIG (2016, setembro 05). Maria Isabel Barreno (1939-2016).

Coutinho, Isabel (2016, setembro 03). Morreu Maria Isabel Barreno, que foi mais do que uma das «Três Marias». Público

Movimento Democrático de Mulheres, MDM (2017, novembro). Mulheres de Abril, Maria Isabel Barreno.

Porto Editora (s.d.). Maria Isabel Barreno. Biografia.

Silva, João Céu e (2016, setembro 04). Morre Isabel Barreno, uma das Três Marias que mudaram Portugal. Diário de Notícias.

Fonte

Arquivo do Instituto Nacional de Investigação Industrial. (1959 – 1980). (PT/FCT/INII), Arquivo de Ciência e Tecnologia, Lisboa, Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Fevereiro

Sabia que os Planos de Fomento fizeram 70 anos?

Os Planos de Fomento foram os mecanicismos dinamizadores da economia nacional do Pós-II Guerra Mundial e da descolonização e tiveram um impacto muito grande na economia portuguesa da época contribuindo para o crescimento económico e para a industrialização do país.

Incorporavam planos de investimentos de obras públicas, como por exemplo portos, aeroportos, etc., e também a criação de empresas que incluíam capitais privados tais como a TAP, a RTP, entre outras.  Contemplavam um conjunto de medidas obrigatórias para o sector público e medidas de enquadramento para o sector privado com um caráter meramente indicativo (Carlos & Escorrega, 2015).

Foram implementados 4 planos de fomento com uma duração de seis anos e um plano intercalar com uma duração de três anos, sendo que o primeiro foi estabelecido em 1953. Os planos de fomento tiveram uma abrangência de 26 anos com a seguinte distribuição:

  • I Plano de Fomento (vigorou entre 1953 e 1958):

Este plano, aprovado pela lei nº 2058, de 29 de dezembro de 1952, apresentou um conjunto de investimentos direcionados para a construção de infraestruturas e indústrias de base. Contudo não representava, ainda, um corte profundo com os interesses rurais porque nesta fase a industrialização ainda estava dependente do crescimento da agricultura (Caeiro, 2005). Esta estratégia começou a ser esboçada com a Lei de Fomento e Reorganização Industrial, em 1945, e ganhou estrutura neste Primeiro Plano de Fomento (Bastien & Nunes, 2019).

Não foi muito além de uma lista de investimentos tal como havia acontecido com a Lei de Reconstituição Económica que vigorou entre 1935 e 1950 (Gonçalves, 2020) e , no programa de investimentos não contemplou qualquer investimento de apoio à investigação.

  • II Plano de Fomento (compreendeu o período entre 1959 e 1964):

O segundo plano não introduziu grandes novidades em relação ao plano anterior, apesar de prever mais investimentos em novos setores (por exemplo, o setor pesqueiro na metrópole) (Ferraz, 2019). Este plano foi aprovado pela Lei nº 2094, de 25 de novembro de 1958.
Veio associado a uma maior abertura da economia portuguesa, que passou pela adesão de Portugal à Associação Europeia do Comércio Livre (EFTA), ao Fundo Monetário Internacional (FMI), ao Banco Mundial (BM) e ao Acordo geral de Tarifas e Comércio (GATT), contribuindo para a aceleração do crescimento e do processo de industrialização, sem deixar de acentuar algumas fragilidades normais de uma economia dependente, nomeadamente em termos financeiros e tecnológicos (Bastien & Nunes, 2019).

O orçamento do II plano contemplava uma rubrica para investigação e ensino técnico dedicando um total de 238.000 contos para investigação aplicada.

  • O Plano Intercalar (decorreu entre 1965 e 1967):

Com o plano intercalar surge pela primeira vez a preocupação com o planeamento regional e com uma distribuição mais equitativa do rendimento (Bastien & Nunes, 2019).
Aprovado pela Lei nº 2123, de 14 de dezembro de 1964, representa o despertar da necessidade de liberalização do comércio externo e de as empresas enfrentarem a concorrência externa, estratégia que estava alinhada com o sistema económico misto presente nas economias europeias mais desenvolvidas. Contudo, este período de grande abertura externa sustentou o crescimento económico havendo uma notória aproximação económica relativamente aos países europeus mais desenvolvidos (Bastien & Nunes, 2019).

O plano intercalar dedicou o capítulo VII ao ensino e investigação contemplando um investimento total de 874.000 contos.

  • III Plano de Fomento (abrangeu os anos de 1968 a 73):

O terceiro Plano de Fomento, no qual emergiu uma nova política industrial, foi aprovado pela Lei nº 2133, de 20 de dezembro de 1967, inicia-se durante o governo de Marcelo Caetano e surge como uma continuidade do plano intercalar.

Neste plano reconhece-se a necessidade de deixar cair o modelo de crescimento que tinha por base a orientação interna denominada de inward orientation, substituindo-a por uma visão focada nas vantagens comparativas e na concorrência internacional, numa tentativa de modernização do tecido industrial e redefinição do sector industrial (Carlos & Escorrega, 2015).

Neste plano mantém-se a preocupação com o investimento em investigação sendo o capítulo X dedicado ao ensino e investigação. Neste caso este capítulo divide-se em secções sendo a primeira dedicada à educação e investigação ligada ao ensino e a segunda à investigação não ligada ao ensino.

  • IV Plano de Fomento (destinava-se ao período de 1974 a 1979, mas apenas teve um ano de execução):

O quarto plano estipulou maiores investimentos em diversos setores da metrópole e das províncias ultramarinas, mas também apresentou previsões económicas mais detalhadas para uma gama mais ampla de indicadores. Incluiu também vários estudos que analisaram as questões das assimetrias regionais e das relações externas de Portugal no contexto da integração europeia (Ferraz, 2019).

Este último plano, aprovado pela Lei nº 8, de 26 de dezembro de 1973, foi o mais elaborado de todos, embora tenha sido o único que não teve praticamente nenhuma implementação financeira, uma vez que, depois do 25 de Abril de 1974, que derrubou o regime do Estado Novo, foi promulgado o Decreto-Lei nº 203/74, prevendo a imediata revisão deste plano. Contudo, em vez de uma revisão, que consiste numa atualização à luz de acontecimentos internos e externos, o quarto plano foi abandonado. Esta decisão marcou o fim dos planos de desenvolvimento em Portugal (Ferraz, 2019).

Neste plano o capítulo XII era dedicado à investigação e desenvolvimento tecnológico e estava dividido em alíneas que contemplavam estratégias de desenvolvimento, programação de ações a desenvolver, os domínios prioritários de investigação e a informação científica e técnica.

A Biblioteca da FCT possui uma coleção bibliográfica dos Planos de Fomento, constituída, na sua maioria, por relatórios e estudos relativos ao planeamento, à execução e ao acompanhamento dos Planos de Fomento. Podem pesquisar no nosso catálogo toda a documentação que integra esta coleção.

A biblioteca da FCT criou uma lista pública que engloba toda a documentação que compõe a coleção Planos de Fomento. Pode consultar os registos, fazer download da lista ou imprimir. Todos os recursos bibliográficos que integram a lista estão disponíveis para consulta na Biblioteca.

Paula Seguro de Carvalho

Referências Bibliográficas

Bastien, C., & Nunes, A. B. (2019). A evolução da economia do desenvolvimento: ensaio sobre o caso português (61; Série Documentos de Trabalho. Working Papers Series).

Caeiro, J. (2005). Os planos de fomento nacional no contexto do desenvolvimento económico nacional no pós guerra. Intervenção Social, 31, 193–219.

Carlos, L., & Escorrega, F. (2015). Da evolução da economia portuguesa no período da guerra do ultramar. Revista de Ciências Militares, III(1), 411–430.

Ferraz, R. (2019). The Portuguese development plans in the postwar period: How much was spent and where? Investigaciones de Historia Económica, 15(3), 1–11.

Gonçalves, N. I. (2020, August 26). Saudades do Plano de Fomento. Jornal Tornado Online.

Janeiro

Sabia que…

A 8 de janeiro de 1851 ficou demonstrado publicamente o movimento de rotação da terra?

O responsável por esta demonstração científica foi um físico francês chamado Jean Bernard León Foucault (1819-1868) que desenvolveu o seu trabalho com base em experiências científicas e tecnológicas, sobretudo no domínio da eletricidade, tendo desenvolvido técnicas para uma atividade que veio a ser conhecida como a Eletrotecnia.

Os trabalhos que desenvolveu, envolvendo eletricidade, correspondem a uma pequena parte de um conjunto de experiências e estudos que efetuou ao longo da sua vida. Nascido a 18 de setembro de 1819 em Paris, recebeu formação através de professores particulares e em 1839 inscreve-se na Escola de Medicina e da qual viria a desistir após ter frequentado um curso de Microscopia com aplicação de fotografia, através da utilização do daguerreótipo em experiências científicas. Inicia então um período de formação autodidata em Física e Mecânica sob influência de Alfred Donné com quem vem a publicar um Atlas para o curso de microscopia.

Em 1844 Alfred Donné e Foucault apresentam à Academia de Ciências de Paris um aparelho destinado a demonstrações microscópicas que era iluminado por ação do arco voltaico, tendo sido designado por microscópio fotoelétrico. Para além da utilização do microscópio fotoelétrico, desenvolveu também, a par com Hippolyte Fizeau, um aparelho de iluminação com arco elétrico que ficou conhecido por lâmpada fotoelétrica e que foi adaptado a outros instrumentos no âmbito de estudos desenvolvidos na área da Ótica entre 1843 e 1849.

De entre muitas experiências e desenvolvimento de técnicas exploradas por Foucault, o que lhe veio a dar notoriedade pública foi, por um lado, em 1851, a demonstração pública do movimento diurno da terra, e por outro, em 1862 a determinação da velocidade da luz.

De facto, a experiência de que falamos realizou-se primeiro numa sala do Observatório de Paris, para uma audiência de membros da Academia de Ciências de Paris e só depois a demonstração pública, já no Pantheón, durante a Feira Mundial de 1851, o que transformou a experiência num acontecimento nacional. A ideia surgiu enquanto empregava um pêndulo para criar um relógio usado para controlar telescópios, deparou-se então com a ideia de aplicar a técnica para provar que a Terra gira em torno do seu próprio eixo. Para esse efeito, Foucault na sua demonstração, utilizou um cabo de aço de 67 metros e uma esfera de bronze de 28 quilos, instrumento que ficaria conhecido como «Pêndulo de Foucault» e cujo original está exposto no Musée des Arts e Métiers em França.

Foucault baseou a sua demonstração numa das Leis de Newton que refere que um corpo, quando colocado em movimento, move-se em linha reta a partir da sua origem, desde que não seja influenciado por forças externas. Conseguiu desta forma, demonstrar pela primeira vez em público, que apesar de o pêndulo parecer mudar de direção durante o dia, era na realidade o chão que girava sob o pêndulo.

León Foucault foi um homem do seu tempo, onde a experimentação e descobertas científicas aconteciam com alguma relevância. Realizou inúmeras experiências importantes e contribuiu e criou alguns instrumentos, a que se associa, por exemplo, o giroscópio em 1852, tendo dado um enorme contributo no estudo e aplicação da eletricidade e outros domínios da Física, no século XIX.

Bom Ano a todos.

Suzana Oliveira

Webgrafia:

Camenietzki, Carlos Ziller (2001, abril). A Incessante mobilidade da terra. Ciência Hoje, 29, 78-79.

Davidson, Michael W. (2015, maio 13). Jean Bernard León Foucault (1819-1868). Molecular expressions. Science, optics & you. Pioneers in optics.

EnsinoTv (2018, novembro 10). Experiência do Pêndulo de Foucault [Vídeo]. Youtube.

Guedes, Manuel Vaz (2001, dezembro 5). León Foucault: um electrotécnico precursor. Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.

Oxford Reference (2024). Jean Bernard León Foucault (1818-1868) French physicist. Oxford University Press.

Portal São Francisco (s.d.). Pêndulo de Foucault. Recuperado a 20 de dezembro de 2023.