Miguel Eugénio Galvão de Melo e Mota

Fotografia de Maria Arménia CarrondoChefe do laboratório de Citogenética da Estação de Melhoramento de Plantas (1948 – 1955).
Chefe do Departamento de Genética da Estação Agronómica Nacional (1966 – 1992).

Diretor do Laboratório de Microscopia Eletrónica da Estação Agronómica Nacional (1975 – 1992).
Professor da Universidade de Évora (1983 – 1992).


Miguel Eugénio Galvão de Melo e Mota, nasceu em Lisboa, no dia 15 de outubro de 1922.

Após completar os estudos secundários no Liceu Passos Manuel, ingressou no Instituto Superior de Agronomia (ISA) onde concluiu o curso de Engenheiro Agrónomo em 1948.

Estudante interessado em Genética, tinha-se dedicado a trabalho de investigação para obtenção de um coelho Azul de Beveren Angora, em 1944, no Instituto Superior de Agronomia, sob orientação do Prof. Virgílio Canas Martins. As conclusões deste trabalho foram apresentadas no Relatório de Tirocínio, completado em 1948 e intitulado Factores que comandam a côr e o comprimento do pelo no coelho.

Também em 1948 concluiu o Relatório Final do Curso de Engenheiro Agrónomo, realizado no Departamento de Genética da Estação Agronómica Nacional, intitulado Género Fagopyrum (Tourn. ex) Moench.

Frequentou e concluiu outros cursos no ISA, designadamente o de Engenheiro Agrónomo Colonial e o de Engenheiro Silvicultor.

Em 1958 frequentou, nos Estados Unidos da América, o curso de Técnicas de radioisótopos do Oak Ridge Institute of Nuclear Studies e, em 1964, frequentou o ‘4º curso de aplicação de isótopos radioativos’, organizado pela Comissão de Energia Nuclear, em Lisboa.

A carreira profissional, iniciada em 1946 na Estação Agronómica Nacional e no Jardim Colonial, em Lisboa, prosseguiu a partir de 1948 na Estação de Melhoramento de Plantas, em Elvas, como Chefe do Laboratório de Citogenética.

Em 1955 passou a trabalhar no Departamento de Genética da Estação Agronómica Nacional, em Sacavém, e em 1966 passou a ser Chefe deste departamento, já em Oeiras.

Em 1975 foi nomeado, em acumulação com a chefia do Departamento de Genética, Diretor do Laboratório de Microscopia Eletrónica da Estação Agronómica Nacional.

A partir de 1983, e até 1992, foi Professor Catedrático Convidado da Universidade de Évora.

Esporadicamente exerceu a sua atividade profissional no estrangeiro, entre 1950 e 1988, como bolseiro e professor convidado na Suécia, Grã-Bretanha, Estados Unidos da América e Israel.

Os seus trabalhos de investigação foram desenvolvidos no campo da Citogenética, com particular ênfase nos estudos de poliploidia e anfidiploidia induzidas artificialmente, e nos problemas de biologia celular que lhes estão associados, nomeadamente os de estrutura e movimento dos cromossomas.

Os trabalhos de produção artificial de poliploides incidiram especialmente sobre os géneros Trigonella, Secale e Hordeum, onde se obtiveram numerosos autopoliploides; na produção artificial de anfidiploides ocupou-se da obtenção de híbridos entre Triticum e Secale (Triticales), onde igualmente obteve resultados.

Os estudos citológicos incidiram na ação de alguns agentes sobre os cromossomas e concentraram-se no magno problema do movimento anafásico, da divisão celular, que está na base de toda a técnica de produção artificial de poliploides e anfidiploides.

No seguimento desses estudos, elaborou uma nova teoria da anafase em que considerou que os cromossomas se movem autonomamente (não são ‘puxados’ por fibras tractivas nem ‘empurrados’ pelo ‘stemkörper’ de Belar), pela expulsão de uma substância específica, pelo centrómero, na direção da placa equatorial. Apresentou esta teoria em 1956, num Simpósio Internacional de Genética, que desde então tem sido largamente citada na literatura mundial.

Em 1952, e em colaboração com o Prof. Edmond Villax, ao fazer a duplicação do número de cromossomas num híbrido de Triticum e Secale, encontrou uma estranha anomalia, só explicável pela eliminação dos cromossomas do Secale e duplicação dos cromossomas do Triticum. Esse trabalho, publicado na revista Nature em 1953, parece ser o primeiro a apresentar a eliminação completa dum genómio num híbrido interespecífico (e, neste caso, também intergenérico).

Em 1953, em Inglaterra, ao tentar duplicar o fenómeno acima descrito encontrou, num híbrido interespecífico de Avena, uma outra anomalia que consistia na existência de células-mães do grão de pólen binucleadas, com os dois núcleos em meiose, mas não sincronizados, e o mais atrasado sofrendo grande desorganização. Na primavera seguinte, em Elvas, comprovou o mesmo fenómeno nos triticales então já obtidos.

Em 1957, nos Estados Unidos da América, no Oak Ridge National Laboratory, durante a realização de estudos de biologia celular no âmbito do movimento anafásico, encontrou uma anomalia da clivagem em meioses do gafanhoto, o que lhe permitiu resolver uma controvérsia em volta desse fenómeno e demonstrar a existência de um anel contráctil responsável pela divisão da célula em duas. A existência desse anel tinha sido postulada por alguns autores, contra a opinião de outros que admitiam outro mecanismo.

Ainda nos Estados Unidos, iniciou em 1958, com o Dr. B.R. Nebel, no Argonne National Laboratory, os trabalhos de microscopia eletrónica de cromossomas, particularmente sobre a estrutura do centrómero. Parte desse trabalho foi apresentado no X Congresso Internacional de Genética em Montréal, em agosto de 1958 e no V Congresso Internacional de Microscopia Eletrónica, em Filadélfia, em 1962.

Entre setembro de 1964 e agosto de 1965 esteve no Departamento de Genética da EAN, o Prof. Franklin F. Flint, Chefe do Departamento de Biologia do Randolph-Macon Woman’s College, de Lynchburg, Virgínia, EUA, que estudou as afinidades de alguns problemas da divisão celular, no saco embrionário, associado aos problemas do movimento anafásico. O trabalho executado pelo Prof. Flint, com o título Cytochemical  effects of indoleacetic acid and kinetin on megagametophytic development in Lillium, foi publicado em 1967 na Phytomorphology 17(1-4):462-469.

Em 1966 iniciou a sua colaboração com o Departamento de Fitopatologia da Estação Agronómica Nacional num projeto de obtenção de cultivares de melão resistentes ao oídio (‘Tendral’ RO-1).

Em 1974 iniciou o seu projeto de criação de melhores linhas homozigóticas de milho, após recombinação genética a partir de uma ampla base de genótipos de linhas homozigóticas, cujos resultados foram extremamente favoráveis.

Em 1976, com a colaboração da FAO e do IBPGR (International Board for Plant Genetic Resources), iniciou um programa de Conservação dos Recursos Genéticos, com a recolha e caracterização do germoplasma existente em Portugal. Recolhidos no Banco de Genes da EAN alguns milhares de amostras de sementes de plantas cultivadas e espontâneas, Portugal passou a situar-se na primeira linha dos países ativos na Conservação dos Recursos Genéticos Vegetais.

Entre 1945 e 1991 apresentou em encontros científicos, e publicou em jornais e revistas científicas, dezenas de trabalhos de investigação, em Portugal e no estrangeiro.

Sob a sua direção foram publicados livros, revistas, programas e resumos das reuniões científicas que organizou.

Foi membro do Conselho Científico da revista Bioquímica Aplicada.

Ao longo da sua vida participou na Europa, América, Japão, países de Leste como palestrante e organizador em congressos e reuniões científicas sobre Ciências Agrárias, Botânica, Genética, Microscopia Eletrónica; Biologia Celular; Alimentação; Ciências Naturais; Desenvolvimento Económico; Ensino Superior Agrícola; Citoquímica; investigação científica; investigação agrária, Ambiente, apoio ao desenvolvimento da agricultura portuguesa, Bioquímica, Microbiologia, produção animal, investigação e experimentação olivícola, álcool combustível, conservação de recursos genéticos, tecnologia dos cereais, etc.

Foi um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Genética (SPG) e ao longo da sua vida profissional participou em várias parcerias, nesta área, entre Portugal e outros países:

Desde 1971 foi orientador de doutoramentos e membro de júri de vários concursos, bem como, orientador de estágios da licenciatura em Biologia dos alunos da Faculdade de Ciências de Lisboa; do curso de Regente Agrícola das Escolas de Regentes Agrícolas de Coimbra, de Santarém e de Évora; do curso de Engenheiro Agrícola da Universidade de Évora.

Foram-lhe atribuídos prémios, em 1952 o Prémio A. J. da Silva Pereira, do Instituto Português de Oncologia, para trabalhos de investigação ligados ao problema do cancro, pelo trabalho A ação de extratos de sementes sobre os cromossomas; e em 1986 o Fulbright Biological Diversity Award. Em resultado deste prémio, esteve em licença sabática, e por convite, na Universidade de Davis, California, em 1986-87.

Foi bolseiro ‘André Mayer’ da FAO em 1962 e do Institute for Cancer Research em 1963.

Recebeu várias distinções, da Sociedade Espanhola de Microscopia Eletrónica em 1972 como ‘Sócio de Honor’; da Sociedade de Ciências Agrárias de Portugal em 2003, ‘Sócio de Honra’; da Universidade de Évora, em 2006, o grau de Doutor Honoris Causa, pelo seu contributo científico e papel pioneiro na genética de plantas; do IBMC (Porto), em 2009, pelo seu papel pioneiro no estudo dos mecanismos da anafase, durante a divisão celular. O Aero Club de Portugal concedeu-lhe o ‘Diploma de Honra’ em 1986.

Colaborou em sociedades científicas nacionais e estrangeiras.

Em Portugal foi sócio fundador da Sociedade Portuguesa de Microscopia Eletrónica (SPME, hoje SPMicros) e da Sociedade Portuguesa de Energia Solar. Desempenhou cargos de direção noutras organizações como secretário-geral, presidente, vice-presidente e coordenador de comissões de especialidade.

No estrangeiro foi membro da EUCARPIA, Associação Europeia para a Investigação ligada ao Melhoramento de Plantas, da Royal Microscopical Society, Inglaterra; da Sociedade Espanhola de Microscopia Eletrónica e da Sociedade Espanhola de Genética.

Na vida privada foi Piloto de Vôo Sem Motor (Planadores) e de monomotores. Como sócio do Aero Club de Portugal, participou na II Volta Aérea a Portugal em 1960 e, no início dos anos sessenta, foi o primeiro Diretor da Secção de Voo Sem Motor. Exerceu ainda o cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral deste clube em 1983-84. Em 1984 presidiu à Comissão Organizadora das comemorações do 75º Aniversário do Aero Club de Portugal, que representou na Comissão, nomeada pelo Ministro de Defesa, para o Monumento a Sacadura Cabral e Gago Coutinho, inaugurado em Belém no dia 14 de novembro de 1991.

Faleceu em Oeiras em 24 de março de 2016, aos 93 anos.


 

Fontes:
Arquivo de Ciência e Tecnologia da FCT: Espólio Miguel Mota

 

abril de 2023