Adesão de Portugal à ESA

 

Rosália Dias Lourenço
Arquivo de Ciência e Tecnologia da Fundação para a Ciência e a Tecnologia

 

Portugal, o 15º Estado-Membro da Agência Espacial Europeia (ESA), é membro de pleno direito desde novembro de 2000, ainda que a participação portuguesa a nível internacional tenha sido iniciada muito antes. Já em meados dos anos sessenta, com a criação na JNICT do Gabinete Técnico do Espaço Exterior, a que sucedeu a Comissão Permanente de Estudos do Espaço Exterior, foi atribuído a estas unidades o acompanhamento de iniciativas nacionais e internacionais em matérias relativas ao conhecimento e à exploração do espaço atmosférico e extra-atmosférico; a elaboração de programas espaciais e apoio à sua execução; a articulação e coordenação das representações nacionais em eventos internacionais.

Mas só a 28 de dezembro de 1989, por Despacho Conjunto dos Ministros da Defesa Nacional, do Planeamento e Administração do Território, dos Negócios Estrangeiros, da Indústria e Energia e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, foi constituído um Grupo de Trabalho para conduzir as negociações de adesão de Portugal à ESA. Os membros deste grupo foram designados por Despacho Conjunto de 30 de novembro de 1990, no qual era proposto o lançamento de um Programa Nacional na área do Espaço que incluísse a adesão de Portugal à ESA; que esta adesão fosse negociada de forma a obter o estatuto de membro associado num prazo de 2 anos e a adesão plena em 5.

Durante o processo de adesão foi mantido o contacto com a ESA para uma aproximação ao seu potencial científico e tenológico que, com a participação nacional em alguns programas, possibilitou o acesso a documentação tecnológica o que muito contribuiu para o desenvolvimento da indústria e do sector tecnológico espacial. De grande importância para Portugal foi a experiência de participação no processo de desenvolvimento, fabrico de componentes e exploração de dados do satélite POSAT1.

Fonte: Arquivo José Mariano Rebelo Pires Gago PT/FCT/MG/IP

Em dezembro de 1999, conforme documentado na fotografia, foi celebrado Acordo entre a Agência Espacial Europeia e o Governo da República Portuguesa, representados pelo Ministro da Ciência e Tecnologia, José Mariano Gago, e pelo Diretor Geral da ESA, Antonio Rodotà.

A Agência Espacial Europeia (ESA) formou-se em 1975 a partir de duas organizações espaciais europeias – a Organização Europeia de Investigação Espacial e a Organização Europeia de Projeto e Construção de Lançadores Espaciais – e os 10 estados-membros fundadores foram Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Reino Unido, Suécia e Suíça.

Com a missão de assegurar o desenvolvimento, para fins exclusivamente pacíficos, da cooperação entre estados europeus nos domínios da investigação fundamental e aplicada ao âmbito espacial, visando a respetiva utilização para fins científicos, os estados associados podiam ter estatuto de Estado-membro, membro associado ou participante.

Além da sede em França, a ESA tem outras instalações: nos Países Baixos, o Centro de Investigação e Tecnologia Espacial; em Itália, o Centro de Observação da Terra; na Alemanha, o Centro Europeu de Operações Espaciais e o Centro Europeu de Astronautas; e em Espanha, o Centro Europeu de Astronomia Espacial.

A primeira missão científica da ESA, em 1975, foi o lançamento de uma sonda espacial de monitorização das emissões de raios gama no universo. Os programas que se seguiram, muitos deles em parceria com a NASA, incluem voos espaciais tripulados; missões de exploração não-tripuladas para planetas e para a Lua; manutenção do Centro Espacial de Kouru, na Guiana Francesa; conceção de veículos de lançamento.

A ESA tem um papel fundamental na gestão de um esforço industrial europeu conjunto, no desenvolvimento da tecnologia de acesso ao espaço, observação da terra, geoposicionamento e missões científicas, muitas delas focadas na exploração de outros planetas. Aposta numa clara liderança industrial em áreas de inovação ao fomentar a colaboração com centros de investigação e desenvolvimento para trazer a ciência e a tecnologia para o mercado espacial; fomenta o envolvimento de todos os Estados Membros na colaboração entre empresas e academia, e na partilha do conhecimento e experiência adquiridos. Garante, assim, aos europeus, o acesso independente ao Espaço, sendo uma entidade chave na promoção da competitividade e equilíbrio de forças do sector, o que permite à Europa ter o seu programa de exploração espacial, mas também cooperar com outros países e agências espaciais.

É fundamental para a estruturação e desenvolvimento da indústria espacial portuguesa na consolidação do trabalho já feito, na progressão da cadeia de valor e no reforço de parcerias internacionais para o fornecimento de produtos, serviços e aplicações de forma cada vez mais competitiva. Ao longo destes mais de 20 anos de adesão foram criadas empresas no sector das tecnologias espaciais; projetos da área espacial foram desenvolvidos pela indústria em colaboração com as universidades e Portugal participou em todos os principais programas da ESA, incluindo as Telecomunicações e Aplicações Integradas, Galileo e atividades relacionadas com a Navegação, Observação da Terra e Exploração Científica e Robótica.

Em 2010, no 4º Forum promovido pela FCT no Pavilhão do Conhecimento, de comemoração dos 10 anos de adesão, foi apresentado um Estudo de Impacte da Participação Portuguesa na ESA. Neste estudo foi demonstrado que, ao longo dos 10 anos de adesão, Portugal tinha multiplicado por um fator de 30 o número de trabalhadores no sector espacial e por um fator de cerca de 6 o volume de negócios das empresas espaciais. Tinha passado a integrar as cadeias de fornecimento da indústria espacial, a ter oferta de formação de engenheiros aeroespaciais e a estabelecer ligações entre a academia e as empresas deste setor.

Os nossos engenheiros aeroespaciais começaram a participar em estágios da ESA, da NASA e de empresas nacionais com participação nas cadeias de fornecimento da Europa. A participação nestes projetos permitiu-lhes também que integrassem as cadeias de fornecimento mundiais.

Inauguração da Estação de rastreio da ESA, 17 de janeiro de 2008, Santa Maria

Decorrente da adesão à ESA foi a criação de uma entidade multilateral focada no estudo e monitorização do oceano Atlântico, com utilização intensiva da infraestrutura de satélites e a construção de um Porto Espacial nos Açores, que dá suporte aos lançamentos do Ariane, a partir de Kourou, na Guiana Francesa, e às operações de satélites de variadas missões espaciais.

Com o crescimento da infraestrutura e dos recursos em Santa Maria, Portugal tem sido capaz de obter contratos com grandes clientes institucionais (ESA, EUMETSAT, GSA/EUSPA) e com empresas “New Space” do mercado global.

Nas últimas duas décadas a maioria da atividade espacial portuguesa foi feita através da ESA e, por isso, todos os grandes marcos tecnológicos e programáticos estão ligados a esta participação. Contribuímos para várias missões científicas, no desenvolvimento de veículos orbitais e nas cadeias de construção de satélites, mantendo uma presença permanente no Porto Espacial Europeu, prestamos serviços de Observação da Terra.

Em 2019 a área do Espaço em Portugal foi impulsionada pela criação da estratégia nacional Portugal Espaço 2030, a desenvolver pela agência espacial Portugal Space, uma Lei do Espaço e a criação de um centro de investigação para o Atlântico Air Centre.

A estratégia nacional refere que a ESA terá um papel charneira para conseguir, nos próximos 10 anos, a multiplicação por 10 do investimento no setor, com um forte componente de investimento privado; criar cerca de 1000 novos postos de trabalho altamente qualificados; o desenvolvimento do setor industrial pelo crescimento da comunidade em número e em dimensão; bem como atrair para Portugal empresas líderes europeias.

Adesão de Portugal ao Observatório Europeu do Sul (ESO), 27 de junho de 2000

A Agência Espacial Portuguesa – Portugal Space, criada pela Resolução do Conselho de Ministros nº 55//2019, de 13 de março, alterada pela Resolução do Conselho de Ministros nº 8/2023, de 14 de julho, como associação de direito privado sem fins lucrativos, sucedeu ao Gabinete de Espaço da FCT, que desde que Portugal se tornou membro da ESA teve à sua responsabilidade a participação portuguesa nos programas-quadro de investigação da União Europeia e nos programas Copérnico e Galileu.

Os fundadores da Portugal Space foram a FCT, a Agência Nacional de Inovação, a Direção-geral de Recursos da Defesa Nacional e a Associação RAEGE Açores – Rede Atlântica de Estações Geodinâmicas e Espaciais. Com sede na Ilha de Santa Maria, é responsável pela execução da Estratégia “Portugal Espaço 2030” e pela gestão de programas nacionais e internacionais relativos à investigação, inovação, educação e culturas científicas.

A Portugal Space assumiu as atribuições da Fundação para a Ciência e a Tecnologia na representação de Portugal na ESA, no Observatório Europeu do Sul (ESO) e em todos os programas espaciais da União Europeia (UE). Assim sendo, coordena a participação portuguesa na ESA ao aconselhar o governo português sobre as contribuições e subscrições feitas à ESA. Em colaboração com a FCT, gere os fundos da ESA e do ESO. Representa Portugal na UE, nos assuntos relacionados com o Espaço, nomeadamente o Programa Espacial Europeu (Copernicus, Galileo, GOVSATCOM, SSA) e Horizon Europe. Tem assento no Conselho de Administração da EUSPA.

Mas Portugal também teve de adaptar a sua legislação à política para o desenvolvimento de atividades espaciais em território nacional, em concordância com as suas obrigações internacionais, de forma a tornar mais apelativa a instalação de indústrias e empresas relevantes para o desenvolvimento deste setor. O Direito Espacial visa o desenvolvimento de atividades de investigação jurídica e científica, relativas à aplicação de tecnologia para fins militares e pacíficos no Espaço Sideral para estudo da área emergente da segurança e defesa espacial, e dos desafios legais provocados por novas tecnologias de dupla capacidade.

O AIR Centre é uma organização internacional, sem fins lucrativos, para o desenvolvimento do conhecimento em ‘interações atlânticas’ através de aplicações científicas e tecnológicas, na região Atlântica, com o objetivo de promover a criação de empregos altamente qualificados, com especial ênfase no estudo das interações espaço-oceano-clima. Tem sede no TERINOV, na ilha Terceira, e é uma instituição estabelecida como rede distribuída. A FCT foi uma das instituições fundadoras deste Centro Internacional de Investigação do Atlântico, criado em 2017 para desenvolver atividades de investigação e inovação nas áreas do clima, terra, espaço, oceanos e energia no Atlântico.

Constituído por uma rede de colaboradores internacional que opera na resolução de problemas comuns, desenvolve soluções que aliam as prioridades nacionais aos desafios globais, investigação interdisciplinar e inovação de sistemas terrestres complexos através da cooperação internacional, num processo de diplomacia científica e internacional com uma agenda científica e iniciativas transversais, quer no que toca a projetos de investigação, quer na interligação à rede nacional de ciências e tecnologias e aos seus diversos nós.

As atividades espaciais têm contribuído para o desenvolvimento da ciência e investigação do setor espacial e também para o desenvolvimento de um setor económico relevante na área das aplicações.

No pressuposto de que o Espaço é importante para muitas atividades económicas e é indispensável para a exploração de potencialidades extra-atmosféricas, a nova era espacial tem contribuído para o desenvolvimento de várias áreas tecnológicas e para a criação de sistemas espaciais de prestação de serviços, nomeadamente Telecomunicações; Meteorologia; Cartografia Temática; Navegação; Investigação Científica; Astrofísica; Gestão de Recursos, Ordenamento do Território e Prevenção. Estes sistemas não são só os colocados no espaço, mas também os que se encontram na superfície terrestre, com as suas cadeias de receção, emissão em terra e respetivo processamento de dados.

Várias atividades económicas dependem da exploração espacial para soluções relativas a estruturas; mecânica; propulsão; comunicações; navegação; eletrónica; controlo remoto; automatização; robótica; proteções térmicas e contra radiações; escoamento de calor e eletricidade estática; preparação de hardware e software; novos materiais.

Mas houve também áreas científicas, relacionadas com a microgravidade, que tiveram grande desenvolvimento – medicina; psicologia; bioquímica – para resolução das dificuldades decorrentes da hostilidade do meio espacial nos seres humanos. Através de satélites de observação da Terra, são recolhidos dados úteis para a agricultura, a silvicultura, o planeamento territorial, a cartografia, a meteorologia, a hidrologia e a oceanografia, bem como a prevenção e combate a desastres, a gestão de tráfego terrestre, aéreo e marítimo.

Programa Espaço da FCT dinamiza as atividades da Delegação Portuguesa, promovendo a participação de empresas e institutos de I&DT nacionais nos programas Espaciais da ESA, incluindo os programas implementados ao abrigo do Acordo-Quadro ESA-União Europeia.

Desde 2013 que a FCT assumiu as competências até então atribuídas à Agência de Inovação, relativas ao programa de formação de recursos humanos, com o objetivo de promover a formação avançada de jovens licenciados portugueses através de bolsas de estágio especializado, a elaboração do programa de estágios, a seleção dos candidatos e o acompanhamento do trabalho desenvolvido pelos bolseiros. Os estágios têm a duração mínima de um ano, com possibilidade de renovação por mais um. Os projetos são selecionados por domínios tecnológicos, enquadramento pedagógico e possibilidade de futura inserção dos bolseiros em empresas portuguesas orientadas para a inovação.

As novas indústrias do Espaço têm crescido nas sociedades contemporâneas em virtude dos inúmeros benefícios provenientes dos produtos, serviços e tecnologias e de políticas de estímulo à exploração de dados e sinais espaciais através de serviços e aplicações de base espacial e habilitadas por tecnologias espaciais; ao desenvolvimento, construção e operação de equipamentos, sistemas e infraestruturas espaciais e de serviços de produção de dados espaciais, e ao contínuo desenvolvimento da capacidade e competências através da investigação científica, inovação, educação e cultura científica.

Atualmente composta por 22 Estados-membro, a ESA coordena os recursos financeiros e intelectuais dos Estados-membro, envolvendo-se em programas e atividades muito além do âmbito de cada país individualmente.

Há mais de 45 anos que a ESA define e executa o programa espacial europeu, concentrando-se em saber cada vez mais sobre a Terra, o seu ambiente espacial, o nosso Sistema Solar e o Universo. Focada no desenvolvimento de tecnologias e serviços baseados em tecnologia espacial e dados de satélite, trabalha na promoção das indústrias espaciais europeias e do ecossistema espacial através das suas políticas industriais.

No ACT é possível consultar documentação sobre os antecedentes do envolvimento e participação de Portugal no programa espacial europeu

Agosto de 2023

PDF para download.

Documentos de arquivo (disponível para consulta no ACT)

Comissão Permanente de Estudos do Espaço Exterior (1966 – 1987). (PT/FCT/JNICT/CPEEE), Arquivo de Ciência e Tecnologia, Lisboa, Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Arquivo José Mariano Rebelo Pires Gago (1978 – 2015). (PT/FCT/MG/IP), Arquivo de Ciência e Tecnologia, Lisboa, Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Webgrafia

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SPARC Centro de Investigação de Direito Espacial (2021). Militarização e Usos Pacíficos do Espaço Exterior.

The European Space Agency (2010, dezembro 7).France.

The European Space Agency (2010, dezembro 7). Portugal assinala os dez anos de adesão à ESA.